quarta-feira, 26 de abril de 2017

Uma aprendizagem ou o Livro dos prazeres, Clarice Lispector

"Parou com a possibilidade de dor, o que nunca se faz impunemente"
"Eu já poderia ter você com o meu corpo e minha alma. Esperarei nem que sejam anos que você também tenha corpo-alma para amar. Nós ainda somos moços, podemos perder algum tempo sem perder a vida toda." - às vezes perder algum tempo com a pessoa certa é perder o resto da vida toda. Fica hipotecado o futuro com um pedaço de passado...
"Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregues à nós mesmos, pois isso seria o começo duma vida larga e nós à tememos." - os sonhos que se acalentam, se os vemos a erguerem-se do chão, onde temos os pés, temos medo, fugimos a sete pés de termos o que sempre quisemos com o medo de não ser o que queríamos, o que vamos querer sempre. Prefere-se não começar uma vida entregue a nós e ao que desejamos porque falhar é catedral maior a desabar-nos nas costas, no peso a suportar. Prefere-se nada se fazer do que falhar sonhos, antes falhar realidades, que é o quotidiano de todos, a morte quotidiana e comezinha, das dores menores, com medo de suportar a dor maior - a do sonho falhar e deixar de ter o que sonhar...
"Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar a nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que a nossa indiferença é angústia disfarçada." - grande frase esta última, o mundo parece-me demasiado cheio disto. Fingir amar para disfarçar a angústia de não amar. Penso que será ainda mais angustiante fingir depois de se ter amado, mas espero não vir a comprovar. Não gosto de disfarces nem de disfarçar e para angústia basta-me a de não saber se voltarei a amar, dispenso o fingir amar para maquilhar indiferença pura, só para não estar sozinha com a angústia duma incerteza de entre tantas...

4 comentários:

  1. há aqui uma frase que me fica na retina
    "construímos catedrais e depois ficamos de fora..."
    mesmo, construímos catedrais de vida para, de um momento para o outro, passarmos sozinhos e ao relento as noite frias da Invernia interna!

    bom dia Olvido

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  2. Vi, podemos fingir sorrisos e até "controlar" os sentimentos...mas só nós realmente sabemos o que estamos sentindo, mas eu não finjo e detesto fingidores.

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  3. Respostas
    1. :) eu já gostava, agora gosto ainda mais e fiquei com vontade de ler mais dela.

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