quinta-feira, 30 de novembro de 2017


... e cai já amanhã!!
O meu mês, o mês que adoro por tantas razões e que me entristece na exacta medida do avesso dessas mesmas razões. Os meus anos, o natal, a passagem de ano - o tríptico que é tridente a espetar a alma sem pudores morais ou outros. Quando será que a vida desaguça, faz rombos, os dentes e amolece as garras? 

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

[foto @kat_in_nyc]

Olho a tela em branco e penso em tudo que está por dizer. Bebo o café a pequenos tragos, amargos, como grandes silêncios que tive de engolir. Não sei se agora o que está por dizer é mais ou é menos do que aquela névoa que nos envolve e rouba o norte nos grandes silêncios, onde aprendemos a falar sozinhos, a ter de esquecer o que ficou por dizer para não nos apodrecermos junto com todas as palavras não ditas que, trancadas, nos gritam na solidão esgaçada dos dias. O tempo vai tirando palavras ao vazio, sem que o vazio mude de tamanho ou de tonelada. Vão caindo, devagar e sem estrondo, no passado que não queremos mais. Ganham lugar outras, que se nos enredam na voz que não sabe dizer o que tanto quer dizer, e se emudece, envergonhada da sua vergonha. Com medo do seu medo.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

[imagem @radioshead]

Deu-lhe na mona e enfiou um doce naquele meio sorriso que  diziam não ser carne nem peixe...
Bom dia!

sábado, 25 de novembro de 2017




[foto @bird.ee]

Aqui o mar é sono perpétuo, câmara para o mais terrível segredo.
Entro nele de mãos trémulas, certo das minhas cedências.
Recordo o sabor salino de outras perdas, casas tombadas das quais sou solidária ruína.

Vasco Gato


[Sou solidária ruína de sombra.
É na sombra que se procura o sono que descansa,
é nas ruínas do tempo que se bebe a eternidade, 
que concedemos termos cedido.
Talvez de menos, talvez de mais. ]

sexta-feira, 24 de novembro de 2017


[foto @stevemccurryofficial]

Há olhares alvoroçados de vida guardada por viver, 
e há olhares de alvoroço de vida vivida que transborda.






-museus e museus cheios de obras de arte, e a maior beleza está aqui mesmo, ao meu lado, no que vejo nesses olhos que me olham...
E eu penso que bonito é ouvir uma coisa destas, assim sem aviso, em resposta aquela feminina pergunta, que rompe o silêncio mútuo ainda que não mudo, sobre o que está a pensar a criatura em que encostámos a cabeça, mas calo-me respondendo:
-é isso que as obras de arte tentam reproduzir, essa beleza, que por alguma razão, nos encanta e toca... (No caso dá jeito se for cegueta e tonto, e que deus assim o conserve...amén)

quinta-feira, 23 de novembro de 2017


Quando mais nada resistir que valha
a pena de viver e a dor de amar
e quando nada mais interessar
(nem o torpor do sono que se espalha).
Quando, pelo desuso da navalha
a barba livremente caminhar
e até Deus em silêncio se afastar
deixando-te sozinho na batalha
e arquitectar na sombra a despedida
do mundo que te foi contraditório,
lembra-te que afinal te resta a vida
com tudo que é solvente e provisório
e de que ainda tens uma saída:
entrar no acaso e amar o transitório.

Carlos Pena Filho

[amar o transitório, 
e dar-se o acaso,
 do caso ser eterno,
acusa uma contradição
 sem direito a contraditório]

quarta-feira, 22 de novembro de 2017


Nós somos a distância inacabada,
A proximidade que tende para o infinito




Quem sempre viveu agrilhoado 
não aprendeu a correr atrás, nem a fugir.

Quem nunca aprendeu a escolher 
pensa que as escolhas estão todas feitas.

terça-feira, 21 de novembro de 2017


[foto @olheosmuros]

Tu que sempre foste mudo de caminhos
Perdes-te não saindo do sítio
Segurando no coração o mapa
Desbotado de dedos e de beijos
De corpos alagados de alma
De memórias que não se amachucam 
De presente que não desbota o passado
Pinta esse mapa nos muros dos caminhos que nos cruzam 
Para que não me perca em ti, de ti.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017


Não és o único, há mais surdos de um ouvido... às vezes dá um jeitão, ao que parece.
Bom dia!

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Há dias que aqui não vinha ao encontro da solidão, não me apetecia endireitar as ideias nas palavras, deixei-as marinar nos dias e se calhar deixá-las assentar, ou tentar que a vontade de as formular me invadisse. Agora, aqui sozinha, já noite fechada, no alongar da ponte do fim de dia para a noite, naquele indeciso teimar de deixar anoitecer-me, entretenho-me a desfiar o tempo em palavras. Queria que me tentassem entender como quem ouve por dentro dos meus ouvidos, não queria que se preocupassem em responder, menos ainda que se defendessem, porque o que digo não é para atacar. Não é sequer conselhos que procuro, é ouvidos que queiram compreender, sentindo o lado de cá. Queria, talvez, que percebessem o que se sente quando se ouvem certas coisas e dentro temos um gostar por quem as diz a acolher palavras que parecem bater como portas na ventania. E oiço portas bater por dentro da armadura dos ossos, aqui sozinha, entre o final do dia e o entranhar da noite, numa solidão que não me amarga. Há dias num jantar, em conversa, disse isso, acho que, apesar de tudo o que tem sido a minha vida nos últimos anos, não amarguei... tenho talvez feito o esforço de me relembrar que não o quero, que isso é deixar ganhar a morte, a tristeza, e, sim, a maldade de quem não vale ( e nunca ninguém vale) o desperdício de vida... mas não sei se endureci. Deixei cair os sonhos e deixei a realidade da terra, do chão que nos colhe na queda, plantar-se nos pés, entre os dedos, debaixo das unhas, emaranhada nos cabelos, nos intervalos dos quereres, das vontades e dos ideais cujo fogo a terra abafa, onde a inércia se planta e cresce fulgurante no embaçamento dos dias. Dizem-me fechada e exigente, acho-me tão fechada como dantes, apenas mais descrente, e talvez por isso, muito menos exigente. O que dantes era tábua rasa, agora é quase bónus, ou, pelo menos, não é encarado como corriqueiro, como inerente à partida. Aprendi que nem todos os que parecem gostar gostam, e que nem todos nos consideram e respeitam nos níveis mínimos da reciprocidade. Aprendi, ensinaram-me à força, a sentir-me pequena mais vezes, mas em contrapartida a aceitar isso docemente como meu tamanho real no mundo - e que o mundo pequeno em que vivemos despidos na quimera do aconchego não é sempre tão diferente do grande e frio onde nos movemos sob defesas. Às vezes é a mentira que aconchega, até chamarmos de mentira a mentira. Depois o mundo deixa de ter tamanhos.
Bom, fumar mais um cigarro... agora descartado de palavras.
[foto @joshjack]

Embrenhava-se naquilo e esquecia-se do mundo. Entrava num mundo que fazia seu, onde se falava sem palavras, onde se comunicava em sentires, onde as imagens tocavam e onde era impensável perseguir uma verdade, a certeza do que é certo e definitivo, porque se sabe que as respostas são tantas e as verdades multiplicam-se em conclusões opostas. Ali não sabia a verdade, sentia-a, como se sente calor ou frio, conforto ou desconforto - e isso não era uma conclusão, mas a única verdade. Entrava na história que o absorvia, nas piadas de que ria, no desejo que lhe inundava a existência, no estar-se bem, chegando a esquecer-se dele, e de todas as verdades que lhe exigiam e esperavam dele, e que ele se exigia esperar o mesmo. E era quando se perdia dele que se encontrava. E naquele pedaço idílico perdia o tempo de que ganhava vida. Depois ela chegava, entrava na sala, (im)punha-se à sua frente, e ele emergia do paraíso que se esconde do mundo, fechava a porta, pegava no comando e desligava a televisão. Assim. Desligava e deixava de existir...desligava para a ouvir. Desligava para ela ser. Sempre. Era assim que o mundo tinha sido desenhado - ela aparecia e tudo o resto tinha de se desligar, até ele... E ele que nunca lhe apetecia ouvi-la, nunca a desligava. Mas também nunca a ouvia.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

[ Nick Cave sobre o quadro de Magritte, imagem @radioshead]

Quando o tempo passa muda-nos o por dentro, 
senão é como se não fosse - não fosse tempo.
 Só há tempo quando há mudança, movimento,
 o resto são cristalizações intemporais que habitamos. 
Só há tempo quando foi. Quando é, não há tempo. 
Há já algum tempo que o tempo não é. 
O por dentro cristalizado em ti, tu cristalizado por dentro. 
O tempo é-nos estranho, ainda não foi.

domingo, 12 de novembro de 2017


[@zackmagiezi]

... tão bom. 
Deixar o tempo correr entre os lençóis ... 
de olhos meio abertos meio sonhadores, 
de sentidos meio desejados meio adormecidos. 
Entre o sono sonhado e a vida que sonhamos acordados. 
Entre o sol lá fora e a luz que queremos dentro.

sábado, 11 de novembro de 2017


... ontem numa conversa de amigas surgiu esta frase. Procurei-a e deixo-a aqui porque me parece tão certa e de certa forma tão óbvia. Assim como a conclusão tirada do seu avesso: como mudar com o medo de deixar de se sentir viver com (essa)a mudança? 

[foto @me_and_orla]

Fim de semana a cores, com resquícios de Verão.
Bom dia.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017


[foto @adrianscutariu]

Naquele dia acordaram sem os fios que vinham do céu. Como se lhes tivessem cortado deus. Não havia guião, faltava-lhes o próximo acto e o seguinte e todos os outros, não sabiam que cena seria aquela, as falas emudeciam e a surpresa encarniçava-se no olhar, na paralisia dos movimentos que dantes eram tão expressivos. Sem fios faltava-lhes o sangue e a vida. Vida que nunca foi, que nunca soube ser ou não ser. 
Só agora olhavam o cenário e percebiam verdadeiramente que, naquele momento, aquelas sombras eram deles, e estavam inertes como mortas. Sem saber o que fazer ou para onde ir, o que dizer ou sequer pedir.  Tal como eles, até hoje, tinham sido apenas sombras de simples marionetas que alguém conduz como se deus fosse. E sombra não é gente. Tela não é vida.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017


"Apaixone-se por alguém que você possa mandar à merda"

(...)
"Não se trata de uma agressão — desde que ambos saibam lidar com essa deselegância. Quando não há mais nada de construtivo para dizer, mas ainda há uma certa raiva, é melhor mandar à merda e pronto. O outro costuma dizer “vai você”. A briga acaba ali. A raiva é canalizada. Cada um vai para um canto. Liga-se a TV, abre-se um livro, toma-se um banho. Depois de 15 minutos já dá pra dizer “quer uma batatinha?”. E não há forma melhor de fazer as pazes do que com batatinha. Melhor assim.

Não acredito em amores perfeitos. Nem acredito nos amores que se afundam no pântano das discussões intermináveis ou das palavras não ditas. Acredito nos amores honestos. E, com honestidade, frequentemente queremos mandar quem amamos à merda. Depois passa. A raiva vai embora e só sobra a batatinha. Ainda bem. Vida que segue."

Artigo aqui

Concordo. Não acho, na maior parte das vezes, agressivo, é um desabafo umas vezes, uma brincadeira outras, muitas as duas coisas. Agressivo é dizer coisas do outro que magoam com o objectivo de magoar, apontar defeitos para rebaixar e não para tentar melhorar algo, falar com ressentimento que pretende magoar mais do que o expor para se poder conversar e resolver, ou simplesmente estar-se indiferente ao outro, desinteressado do que possa dizer ou sentir. Quando se manda à merd@ só porque se está farto de ouvir o outro e não se tem já sequer pachorra para o ouvir ou resolver o que quer que seja... aí sim, é mau. Quando é só para acabar a conversa que já os dois concluíram que é parva e sem jeito e não vai a lado nenhum... manda-se e pronto (outras vezes é mesmo só um desabafo e vira-se costas até assentar poeira, há muitas versões), há muitas maneiras, eu gosto desta, quando a coisa é ligeira e as pessoas sabem brincar  "olha, vai à merda, cala-te e dá-me um beijo".

E diga-se também que "Nunca fui muito com a cara dos amores impecáveis.", os que não discutem, não querem saber, não têm ponta de ciumes, são tão tolerantes com tudo que é plena indiferença mútua, desinteresse entranhado... não, para isso não dou, nem sirvo.

Bom dia!

terça-feira, 7 de novembro de 2017

[foto @evapictory]

Tenho a alma a viver há muito no silêncio 
 - vários silêncios, como tons de azul sem céu -,
sem nunca se silenciar.
Há alturas em que peço 
 - que grito dentro sem esgaçar o silêncio de fora que me rasga -, 
que se cale, que não a oiça,
que me deixe ser sem saber, sem querer.
Ser só como o azul do céu.

Será o silêncio da alma,
paz ou morte?

segunda-feira, 6 de novembro de 2017


A luz da manhã entra pela janela mas não nos desperta o dia, trocamos a dormência pelo direito de chamar-lhe sonolência. Enroscamo-nos nos raios de luz e deixamos o dia do lado de fora das mantas, do quente dos sonhos interrompidos, do engano da noite que se esqueceu de dar lugar ao dia por dentro dos olhos, por fora dos sonhos. Fechamos os olhos para deixar a luz do dia entrar devagarinho e amanhecermos sem o susto de existirmos mais a dormir que acordados.

domingo, 5 de novembro de 2017


... these boots are made for walking.
Bora lá.
(Mas não são botas e o som é B. Clementine, combina-me com o dia de hoje)
Bom dia!

sábado, 4 de novembro de 2017



[foto @kat_in_nyc]

Os dias já estão muito mais curtos e as noites mais frescas. A varanda já pede manta, e daqui a nada, eu, lareira. Estava a precisar deste sossego, destetempo só meu, há qualquer coisa que me pede isso, há qualquer coisa em mim que precisa de ser cuidado com tempo e silêncio, peças que precisam encaixar.
Amanhã à tarde café, alguma coisa em mim tem de mudar, sinto que é tempo de qualquer coisa, talvez eu perceba a necessidade só a minha imobilidade não a ouve, há qualquer coisa que falta, só tenho de a procurar em mim, e para isso preciso de tempo e distância. Ando a mastigar a vida e os dias há tempo demais... hoje estou estranha e não sei porquê, falta-me alguma coisa que me falta descobrir o que é. Lembrei-me agora duma frase que uma vez escrevi a alguém, disse-lhe que naquele momento ele era a minha vontade... e é o que se calhar agora me falta, vontade de alguma coisa, para com essa desenterrar todas as outras. Uma pessoa sem vontade é só inércia. Mesmo andando é como se não saísse do mesmo sítio. E tenho de dar lugar a que um novo lugar se torne sítio. Sítios são coisas imutáveis, sem geografia mas com história - é o lugar certo para algo. É onde ficamos presos sem saber porquê. Os lugares ocupam-se quando vazios, e alguns tornam-se sítios para nós. Eu preciso dum novo sítio e preciso de lugar.



As palavras vestem-me
como uma luva,
quando ao longe
te despes de mim.
Se te aconchego,
Ou se te achegas
as palavras esfriam
antes de chegarem aos dedos,
Quentes de ti

sexta-feira, 3 de novembro de 2017


Sexta-feira-quase-noite... 
...assim, com pés e cabeça.
Mas às vezes do avesso, ou de pernas para o ar, ou com os pés pelas mãos, ou mesmo as mãos pelos pés, desde que estivesses sempre ao pé, não vá eu precisar duma mão... ou mesmo duas. Nos sítios certos, ou só no meu avesso. 

[foto @moniblanco]

Na esquina dum eco
A tua voz dobrou-se.
Aninhou-se no vazio
Duma luz apagada.
Perdeu o rasto
Da estrela que nos caiu
Numa rua deserta,
Donde ninguém regressou.

Eu ouvi.

Há certos silêncios
Onde eu oiço tudo.


quinta-feira, 2 de novembro de 2017


... é um tudo que não chega a ser nada.
Como ter a melhor biblioteca do mundo e não saber ler. Como ter a melhor vista sobre a cidade e ser cego. Como ter a melhor e mais bonita casa e não ter com quem viver.
É como guardar dentro o amor mais bonito e, ao mesmo tempo, sentir-se vazio.
É como ser amado e não sentir.
É um tremendo desperdício monumental.
É um quase que não chega a deixar de o ser. 

quarta-feira, 1 de novembro de 2017


[foto @perazna]

Ao acordar da noite das bruxas, coisa para esquecer e correr à vassourada, surge-lhe um anjo à janela, com asas de desejo e todos os pecados de Eva no corpo sublime. As asas que lhe apetecia fazer voar em dedos pela pele, no agarrar a carne, no trincar a vontade, nas mãos cheias de querer, na boca ávida de prazer e cheia de gritos de paixão.
Não se mexe, não dá um passo, não se sabe se por medo ou convicção. Uma certa calma, de passado morno e instalado, ressente-se na alma e pergunta-se apenas, enquanto admira a criatura a que as asas dariam nome de anjo, como o hábito de monge, por que é que certas criaturas nos assombram a existência para mostrar o que não temos e desejamos? E se não fosse um anjo? Se fossem só asas? Se fosse só uma mulher, nem bruxa nem anjo? Uma mulher carregada de pecados que levam ao céu?... Leva à boca um cigarro, o anjo do lado de lá da janela, imóvel, acende-lho, com um único sorriso, malandro e certeiro no olhar dele, a condizer com toda a sua expressão de desafio e tentação, antes de se desfazer do próprio cigarro e bater asas para outra janela, onde os olhos, do lado de lá do vidro, fossem de homem sem medo de bruxas, homem que soubesse aceitar o céu quando lhe oferecem um pedaço num sorriso com pele. E o agarra "comme il faut"