segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

[foto @aretizy]
Falta uma ponte para chegar à outra margem de mim. 
Há dias em que não a encontro, muda de sítio ou simplesmente não existe, 
e uma parte de mim desaparece.
Mas falta-me, falto-me. 
Só nos falta o que notamos que desapareceu. 
A falta só existe quando se sente uma perda.
Quem não sente ter perdido não lhe falta.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

...What if it doesn't?
Do we just keep breaking?
Or broken?
[foto @ryanandray]

"O que eu quero fazer é escrever: pôr tudo a limpo com as palavras. As palavras ditas e as palavras deixadas por dizer. Eu sou as palavras que por mim passam. Palavras que vieram de muito longe, do mais longe de tudo, do começo do mundo. Palavras que vão para longe, para o mais longe futuro, enquanto houver palavras ditas e por dizer. O que desejo é escrever-me. Não inventar a vida dos outros, que não faço a mínima ideia qual possa ser, mas contar a minha. Só a minha é tão misteriosa e enigmática para mim. Tão longe e tão perto que não se deixa apanhar nem com os olhos, nem com os dedos. De mim não consigo descansar. Não é preciso inventar. Inventar é ocupação de mentirosos. O que é preciso é descrever uma vida. A minha. Quando não estiver tão misturada com a dos outros, depois de perfeitamente destilada, isolada na máxima solidão. Onde só as palavras escritas me defendam da morte. É essa a minha tarefa: tornar-me naquilo que sou. Ou então nada."

Pedro Paixao, in  A Rapariga Errada

O que eu quero fazer é não escrever: deixar tudo no vazio das palavras que nem se sabe que ficam por dizer. Não fazem falta serem ditas, nem nos falta ouvi-las. Que não chegam a ser vazio por não serem falta.
O que eu quero é que as minhas frases não precisem de palavras, muito menos tuas.
O que eu quero é que as palavras sejam só palavras e não medidas duma dor que não se descreve, mas que nos gastamos em tentativas de a escrever, sem nunca a gastar.
O que eu quero fazer é não escrever-me: é não me fazer em palavras que dizem como me desfaço. Não me quero em palavras, não me quero em frases nem em parágrafos, nem em falta de vírgulas ou pontos finais. Quero-me depois do vento as levar todas e me deixar analfabeta das palavras que me roubaste porque os significados foram todos mortos por ti. E mortos não contam histórias, mas moram em mim, sem palavras. Desabita-me. Quero casa própria, rua de flores minhas, um pôr do sol só na minha varanda. Quero um sorriso recheado dum significado que ainda não conheço - que ainda não mataste - no alaranjado do sol que se despede sem esfriar, onde ainda possam amanhecer palavras, daquelas que alguém não deixará por dizer e que fazem falta.
Eu não sou as palavras que por mim passam, eu sou o que fica das palavras que passaram, desse amor beijado da tua boca em palavras a que mataste o significado, e que desalmadas me assombram. Palavras que não  me defendem da morte, alimentam-na.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016


... O último grito.
Cheia de esperança de ser 
O primeiro último grito de amor de alguém.
Só há na vida um último
O que nada lhe segue
Esse é o primeiro último, 
único amor de  alguém para toda a vida.
O resto da vida
O último.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Um café para espantar o sono.
Uma mesa que me traz passados bons.
Uma noite que apetecia não acabar.
Uma vontade imensa de fugir para dentro daqueles braços e outra imensa de me esquecer que eles existem, que existiram, e que parecem a casa onde sempre quis morar.
Que saudades. Que vontade de estar, de apertar, de ser. E de nunca ter estado, nunca ter apertado, nunca ter sido. Nunca ter sabido.
Já dizia Kundera que cada segundo tem o peso da eternidade. Não se repete mas fica. É verdade, tenho tantas eternidades que não batem asas de mim, não me largam, não as esqueço, e pesam-me como pesa o passado da felicidade.
Acabou o café. As eternidades desta mesa não. Vejo-a todos os dias. Já o futuro escapa-me a cada segundo. Por paradoxal que seja, só o passado é eterno.

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Um cigarro na mão e a chuva a cair a uns metros, a molhar a varanda que serve de bateria aos pingos que caem tortos do céu. Gosto de ver chover, sempre gostei, da vontade de ninho e de aninhar num sítio quente, onde nos sentimos protegidos do frio molhado que invade o ar. Aninho-me em mim, aqui sentada, embrulho-me em mim e na manta de cor quente. Penso que gostava de ter a memória dela, que não pensa que não sente. Como escrevi há dias, quando será que as minhas memórias vão deixar de sentir? Quando? Quando é que eu serei só uma manta que aquece e não lembra o que já aqueceu?

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016


Dizemos que vamos para a cama dormir, mandamos um beijo, e respondem-nos "que durmas sem tocar nos lençóis e acordes diferente". E eu fico a olhar para aquilo e por momentos leio ali uma ideia querida de "não mudes" - que não seja possível dormir-se sem tocar nos lençóis, que seja impossível que acordes diferente - e constato que continuo uma lírica romântica, que gostava de estar apaixonada ao ouvir isto - que gostava de estar viva - mesmo que saiba, com o seguimento da frase, que não foi nada disso que quiseram dizer. Mas os olhos prenderam-se ali e o coração sedento bebeu da água que não nasceu. E eu sorri sem amor.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016


O meu nome acordou povoado pelo teu nome.
Vasco Gato

E ficou-me atravessado na garganta,
sinto-o a cada respiração,
como se o respirasse, 
como se te respirasse,
como se me respirasses 
sem saber
saber respirar
(Foto @andreatomasprato)

Quando duas pessoas que se amam de perto 
estão juntas, todo o resto do mundo está ausente, 
mas nenhuma ausência está presente. 
É o mesmo com o silêncio, só se sente o silêncio quando não se ouve quem se quer. 
Há coisas que só existem na presença da sua falta.

domingo, 14 de fevereiro de 2016



É no olhar da pessoa certa que encontramos uma ponte para partes de nós que não conseguimos guardar cá dentro.
Parece-me que começo a procurar noutros rostos, noutros olhares, 
algo que me fale, que me dê a mão, que me devolva o sentido do não ter de ter sentido, 
algo que me regresse à essência.
Sei que há coisas que não se procuram e até procuro algo que já dei por perdido. 
Não espero encontrar. Já não espero. 
Mas, sempre à espera de me perder, 
vou mergulhando em olhares sem profundidade para perder o pé. 
Não me perco, não encontro. Mas teimo.
É quando perdemos o pé, quando nos tiram o chão debaixo dos pés,
que descobrimos de que são feitas as nossas asas, 
de que somos feitos, quem somos - se temos asas que se atrevem a voar.
Esse voo é o derradeiro regresso a nós.

sábado, 13 de fevereiro de 2016


(Foto @abu888)
Tempo bom para dormir todo o dia 
agarrada a sonhos que não adormeçam quando acordarmos.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Ficámos à conversa um bom bocado. Há coisas que me diz que eu conheço bem, já as disse assim, já as pensei assim, já estive naquele ponto, e já passei daquele ponto. Não gostaria que ela passasse, não porque ache que eu não o deveria ter passado, devia e ainda bem que o fiz, sinto-me melhor agora, mas porque sei que é doloroso e muito difícil no caso dela porque não acho que se deva desistir quando ainda se gosta, quando ainda há amor. Quando já não há amor, então não, não vale a pena. Se não amamos e já não sentimos que somos amadas, não vale a pena lutar pelo que já não dá descanso aos dias, cor à vida, paz doce ao peito.
 No fim da conversa confessa-me que falar do assunto a cansa, a extenua, a deixa sem ar nos pulmões, como se a própria vida lhe oprimisse a vontade de viver. Que às vezes percebe que é injusta, porque apesar de refilar cheia de razão depois fica a saber das amarguras que se guardam no outro peito, e então sente-se culpada. Disse-lhe: "quando for assim abraça-o. Faz bem aos dois." Disse-me que era o único conselho fácil de pôr em prática e sem contra-indicações...
É incrível como às vezes um abraço pode derrubar defesas, entregar almas e juntar peitos desfeitos.
E é tão fácil, difícil é fazer desse abraço a nossa casa.
Deve ter sido dos melhores conselhos que dei a alguém.


terça-feira, 9 de fevereiro de 2016



Quando é que as minhas memórias vão deixar de ser tuas?

(nunca mais voltei a sentar-me assim sem me lembrar que reparaste,
 e a maneira como o viste)

Saber que a terminação nervosa da nossa pele começa na ponta dos dedos de outra pele.
Saber que o outro extremo da nossa pele está noutra pele
Saber que a outra pele não está na nossa
Saber que a nossa nao vive por baixo da outra que chamamos nossa
Não saber onde estamos por baixo da nossa pele.
Nao saber em que rio desaguar o mar que nos rebenta no peito.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016


(foto @milad_rahimi)
A solidão de sabermos que a nossa ausência 
não deixa um lugar vazio à mesa da vida de ninguém.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016


(Foto @nimaojani)

... Enfrasquem-se os espinhos
Guarde-se o aroma das pétalas na memória da pele.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Testando a nova casa.... a ver a cor das paredes que não difere da casa que abandonei... a avaliar se o espírito está de acordo com as fotografias penduradas. A tentar ajeitar-me.