domingo, 30 de abril de 2017

Caminhadas de sossego...

Sentada num muro onde o sol 
desenha as últimas sombras do dia

Enquanto enquanto a patuda fareja os carros que passam
 numa bolina longe da nossa vagareza.


sábado, 29 de abril de 2017


Gosto quando as pessoas abraçam a paixão que têm. Quando dedicam o seu tempo ao que gostam e fazem-no com simplicidade e inteligência, sem mais razões a acrescentar. Finalmente convenci a moça a fazer da sua paixão também um hobby de que mais gente possa partilhar. Para quem tem o cinema por paixão, sem falsas erudições e pruridos, acho que irá gostar de conhecer esta cinéfila inveterada... Eu gosto.

sexta-feira, 28 de abril de 2017

[foto Laura Williams]


És o único mar da minha cartografia.
Mas talvez haja uma ilha que te fenda
Um continente que te feche
Um terramoto que te afaste
Um oceano que te engula

Só se mapeia o que se conheceu
Mas nos pés trago viagens por calcorrear
Paisagens por pintar
Risos por gargalhar
Chuva por lamber 
Sol por aquecer
Vida por beber a passo firme

Mesmo que não chegue 
a cartografar o destino
no desatino de o não encontrar
Levo o mapa no bolso
Só para o caso de ter de te corrigir 
De te pôr no lugar
E deixar o meu coração no sítio, 
perdido dos sítios que se perderam

Li aquilo e desliguei a luz à espera de fechar algo em mim. Mas a escuridão  bailou-me nos olhos abertos durante muito tempo. Quando os fechei, sem dar conta, entregue ao cansaço, mergulhou-me na alma, e ainda não saiu de lá. A tristeza tem-me submersa. 
Tenho de aprender a respirar outra vez para querer emergir, para precisar emergir para respirar.
Hoje é igual a ontem - podia dizê-lo, não é mentira, mas não diz a verdade; uma especialidade de artistas que manipulam luzes e sombras, verdades e mentiras que não o são, sendo-o. 
Está tudo igual, tudo continua na mesma, no entanto, tudo mudou. Por dentro, no avesso de tudo que nos acontece, que nos respira e tem a nossa história, lá, onde não se vê, mas onde se vive ou morre, tudo mudou.

quinta-feira, 27 de abril de 2017


Uma cadeira pode estar vazia, mas não deixar de ser o sítio de alguém.
O lugar na cadeira pode ser ocupado, mas o sítio não.

Lugares podem ser ocupados e variar, podem ser substituídos na sua ocupação. Os sítios não são lugares, as coordenadas -  a haver -, podem não ser sequer geográficas.
Sítio é uma pertença sem lugar.
Um lugar sem pertença é só um espaço a preencher.
Acho eu.
[foto @kat_in_nyc]

"É que o carinho entre os casais não são jantares fora nem fins de semana na praia – isso são banalidades da classe média, são agradáveis, mas não são carinho.
E a intimidade não é ver séries juntos – isso é amizade, proximidade, cumplicidade até, mas intimidade é outra coisa.
Carinho e intimidade é encostar a cabeça no ombro, é deixar pôr a mão dentro da roupa, é cheirar a pele, é apalpar a mama só porque é bom, tocar com o dedo aqui ou ali porque sabe bem, sentir a tesão do outro, mesmo que seja só para ter tesão.
Depois disso pode ser que haja mais coisas, ou então não. E não importa: já se deu a essencial."

A intimidade pela mão  do Menino como se fosse pela minha, mas muito melhor.

Não, a intimidade não é viagens ou jantares fora, é acima de tudo jantar juntos, rir juntos, sentir o silêncio juntos se sem dar pelo silêncio, é a pele não ser estranha ao diálogo, à brincadeira, é saber que juntos não é medido pelo espaço entre os dois ou pela falta dele, é uma comunicação que não se cala, é uma presença que é e não que está - é um ser juntos em vez de, apenas, estar juntos.
É um "juntos" que não é estar perto, é ser de dentro, é essência.
É ser parte do nosso essencial.
É sublimar-nos.
A essência é sempre sublime, como a intimidade.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Uma aprendizagem ou o Livro dos prazeres, Clarice Lispector

"Parou com a possibilidade de dor, o que nunca se faz impunemente"
"Eu já poderia ter você com o meu corpo e minha alma. Esperarei nem que sejam anos que você também tenha corpo-alma para amar. Nós ainda somos moços, podemos perder algum tempo sem perder a vida toda." - às vezes perder algum tempo com a pessoa certa é perder o resto da vida toda. Fica hipotecado o futuro com um pedaço de passado...
"Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregues à nós mesmos, pois isso seria o começo duma vida larga e nós à tememos." - os sonhos que se acalentam, se os vemos a erguerem-se do chão, onde temos os pés, temos medo, fugimos a sete pés de termos o que sempre quisemos com o medo de não ser o que queríamos, o que vamos querer sempre. Prefere-se não começar uma vida entregue a nós e ao que desejamos porque falhar é catedral maior a desabar-nos nas costas, no peso a suportar. Prefere-se nada se fazer do que falhar sonhos, antes falhar realidades, que é o quotidiano de todos, a morte quotidiana e comezinha, das dores menores, com medo de suportar a dor maior - a do sonho falhar e deixar de ter o que sonhar...
"Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar a nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que a nossa indiferença é angústia disfarçada." - grande frase esta última, o mundo parece-me demasiado cheio disto. Fingir amar para disfarçar a angústia de não amar. Penso que será ainda mais angustiante fingir depois de se ter amado, mas espero não vir a comprovar. Não gosto de disfarces nem de disfarçar e para angústia basta-me a de não saber se voltarei a amar, dispenso o fingir amar para maquilhar indiferença pura, só para não estar sozinha com a angústia duma incerteza de entre tantas...

... O passeio já não chegou a tempo para as pernas, mas os olhos ainda se passeiam nas cores-promessa do calor futuro que há-de colar-se à pele. 
Talvez amanhã. 


...era um daqueles sorrisos, que se tivesse dentes, mordia.
Sorriso franco.
Sinceramente irónico.
Inocentemente sarcástico.
Bonito, mas perigoso... talvez por isso.
Daqueles sorrisos que nos levam
e, sem sabermos,
nunca mais nos regressamos. Nem queremos.

(Aparecem-me frases, assim, sem mais, algumas não sei o que lhes fazer, não parece que sirvam para nada, vou guardando... Como migalhas no fundo do bolso ou palavras estendidas na corda à espera de serem vestidas por um fim de tarde qualquer, a seguir a uma reunião chata...agora apetece-me casa, despir o vestido, enfiar umas calças de ganga, umas sabrinas e ir aproveitar um passeio com muita pinta aos últimos raios de sol se chegar a tempo de ainda os apanhar... e é o que vou fazer. Já.)

terça-feira, 25 de abril de 2017

...acordar com um telefonema de trabalho, 
do lado de lá o riso solto agarrado a um "ahhhh voz de cama...", 
desligar, 
ler meia dúzia de páginas que falam a minha língua, 
desligar outra vez, 
agora o mundo, e voltar a dormir.
 Ahhh dormir.... coisa tão boa!!...
Acordar com uma dois pares de patas, cheia de pinta,  a lamber-me a cara... E começar o dia assim,
 com a música dos pés a acordarem o corpo pé ante pé, ao ritmo do respirar da pele.
Assim. 
Bom dia!

segunda-feira, 24 de abril de 2017

[foto @diego_durden]

Onde a desconfiança rasga, 
a intimidade quebra
Onde a cumplicidade definha, 
a mentira cresce 
Onde a distância se acomoda
a proximidade incomoda
Onde o frio se instala, 
o amor estalou há muito

Uma aprendizagem ou o Livro dos prazeres, Clarice Lispector

Será real, possível, escolher-se a mediocridade por se ter medo da felicidade?? Será que isto existe mesmo? Será que se consegue escolher a infelicidade? Escolher mesmo, em consciência? Isso não será contra todo o instinto de sobrevivência? Contra toda a essência?
Ou à sobrevivência chamam a intenção de evitar uma dor insuportável, que é a de conjugar a felicidade no passado e ainda lhe sentir o gosto doce a apodrecer na boca? E por isso preferir a mediocridade, desculpando-se com a sobrevivência. E essa mediocridade não será insuportavelmente dolorosa? 

[Não acredito, acredito que por sobrevivência, em tendo escolha, se escolhe sempre o que achamos fazer-nos mais felizes.]

domingo, 23 de abril de 2017

[foto @tinorenato]

De que serve o céu ser imenso 
se só vimos o que os nossos olhos alcançam?
Para que é que o mar une todas as terras 
se os nossos braços não o conseguem atravessar?
Por que é que o sol é tão forte 
e a pele sedenta tão frágil?
Por que é que o amor é infinito se os seres são tão limitados?
..., ou será por isso?

(Perguntas perguntas perguntas, e a vida não responde, acho que quando não sabe, combina com o tempo e muda-nos as perguntas...e nós fingimos que esquecemos, ou esquecemos mesmo?)

sábado, 22 de abril de 2017


[foto @kat_in_nyc]
... Onde me levas? É sábado de manhã todo o dia, lembras-te?
- vou-te levar a almoçar.
- não podemos almoçar na cama?... Humm?
- não, está sol, vou-te levar a almoçar fora!
-bahhh... Não quero, quero ficar aqui contigo, comer qualquer coisa e continuar a manhã...Entao e vais-me levar assim ao colo?
-sim, a varanda é perto... 
Riu-se e meteu o nariz entre o braço dela e o pescoço dele, cheirava a fim de semana, a ronha doce e a um dia só deles, só com coisas deles, ridículas como um dia de sol desperdiçado...

[as coisas parvas que me ocorrem por me pôr a ver fotografias...]

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Há pessoas com uma tal cara de pau, que o creme de barbear deve ser óleo de cedro, só pode (e eu não sou especialista em óleos... Nem em cremes de barbear, já agora). É o que me apraz dizer a caminho de casa a esta hora, com a espinha vergada ao cansaço e os nervos emaranhados de irritação... 
... Às vezes o ódio está a uma faísca de distância, outras incendeia sem darmos pela faísca.



Almoço com escapatória na vista. 
Escapar de quê?
Escapar para onde?
Tenho de voltar a apaziguar-me depois de tantas constatações e clarividências e sonhos reveladores de verdades sabidas e não sentidas até agora. Tenho de voltar ao antes com os olhos do depois, com que agora olho tudo. Tenho de voltar a arredar sentimentos com a força do pensar, e arredar pensamentos na força do sentir, como se arredam móveis para limpezas mais fundas, para apagar as provas do tempo que passou e se esqueceu de ser, de nos ser.
Ocupar a cabeça, limpar anos inteiros e afastar palavras antigas embrulhadas em papel de rebuçado, que afinal são doces baratos para todas as mãos. Mas não é novidade. Nada é novidade. Não há novidades que se aproveitem nos dias. Nao, não posso dizer isto, é injusto, algumas novidades vão sendo boas, por não piorarem nada, por serem bons sinais e nos deixarem poisar e respirar um pouco. Há coisas boas. Que há. Pena haver ainda tantas más agarradas ao sangue que sente e circula vezes sem conta por dia, pelo corpo acima, pela alma abaixo. Precisava de purgar a vida disto tudo. Ou talvez ela mesma o faça. As palavras só já não chegam, precisava de mais, de muito mais, que é tão pouco.

Tenho medo do vento. Não sei voar. Descasquei as feridas das asas que me descalçaram, e não nasceram mais. As asas não eram minhas, nunca soube voar. Tenho medo das mãos de vento e dos corações de corrente de ar. 
...e  a minha companhia patudinha para esta sinfonia do vento tem tanto medo como eu, parece-me. E qualquer dia não cabe no caixote. Eu já não caibo há muito tempo e ainda tenho medo. Preciso dum caixote maior, para ela e para os meus medos. Eles também já não cabem no caixote. Mas disso já não tenho medo, sei que eles se moldam para caber, ajeitamo-nos a disfarcar a falta de espaço, porque livro-me de poucos... Mas tenho cada vez menos medo que me descubram, que me saibam, e cada vez mais medo de me descobrir e de me saber como não me quero, como não gosto. Os outros importam-me cada vez menos, aqueles que não são meus e de quem nada sou. Dos meus tenho cada vez mais medo que descubram que me falta tudo o que gostam em mim. E isso cabia no caixote.

quinta-feira, 20 de abril de 2017


A noite está boa, de quase Verão. Há coisas que não faz mal serem quase, outras que se forem quase, não chegam a ser nada. As vezes o quase é estar tão perto que nunca se chega, outras o quase é já ter chegado a algum lado, mas não exactamente onde se quer. Às vezes é difícil saber se isso é alguma coisa - se nos serve de alguma coisa, e ao que queremos realmente, à nossa felicidade. Se quase servir, não é. Quando não se sabe o que se quer, qualquer coisa serve e não chega a ser quase. Não serve de nada, para nada. É um quase nada. 
Como isto que escrevo, que me surge do nada por quase nada, numa noite de quase Verão, com o último cigarro nos dedos quase fumado. Quase não tenho frio, mas ainda tenho.

quarta-feira, 19 de abril de 2017


Quando passo por fotos como esta que me lembram sessões de cinema, lembro-me daquela vez em que me saiu - sem filtros - a frase "apetecia-me ir ao cinema, mas não ver filme"... houve quem tivesse achado piada à frase, quem se tenha rido e a tenha sentido (penso eu), mais do que entendido, como eu a senti sem pensar, quando me saiu. Pela piada que lhe achou ou pela semelhança de ideias, não sei, guardou-a na algibeira das conversas para a ter sempre à mão para me dar de troco. E deu, várias vezes, acompanhado dum sorriso que me endividou a alma.
Ainda me lembro. Mas já quase não.
Agora lembrei-me, mesmo não sendo dia de cinema, mas apetecia-me. Não o filme.
(é melhor sair destas quatro paredes enquanto há luz e sol e não fazer mais filmes... nem dizer mais disparates, ou tentar)

...pois eu só há um e mais nenhum, autocarros é o que há aqui mais... 
ehehhehe

Bom dia


Uma aprendizagem ou o Livro dos prazeres, Clarice Lispector

"Parou com a possibilidade de dor, o que nunca se faz impunemente"
"Eu já poderia ter você com o meu corpo e minha alma. Esperarei nem que sejam anos que você também tenha corpo-alma para amar. Nós ainda somos moços, podemos perder algum tempo sem perder a vida toda." - às vezes perder algum tempo com a pessoa certa é perder o resto da vida toda. Fica hipotecado o futuro com um pedaço de passado...
"Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregues à nós mesmos, pois isso seria o começo duma vida larga e nós à tememos." - os sonhos que se acalentam, se os vemos a erguerem-se do chão, onde temos os pés, temos medo, fugimos a sete pés de termos o que sempre quisemos com medo de descobrir não ser o que queríamos, o que vamos querer sempre. Prefere-se não começar uma vida entregue a nós, e ao que desejamos, porque falhar é catedral maior a desabar-nos nas costas, no peso a suportar no caminho que faltar andar. Prefere-se nada se fazer do que falhar sonhos - antes falhar realidades, que é o quotidiano de todos, a morte quotidiana e comezinha das dores menores - com medo de suportar a dor maior, a do sonho falhar e deixar de ter o que sonhar...
"Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar a nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que a nossa indiferença é angústia disfarçada." - grande frase esta última, o mundo parece-me demasiado cheio disto. Fingir amar para disfarçar a angústia de não amar. Penso que será ainda mais angustiante depois de se ter amado, mas espero não vir a comprovar. Não gosto de disfarces nem de disfarçar e para angústia basta-me a de não saber se voltarei a amar, dispenso com a força da vida que me resta nas veias, o fingir amar para maquilhar indiferença pura, só para não estar sozinha com a angústia duma incerteza de entre tantas...

segunda-feira, 17 de abril de 2017


Estou eu a fazer o meu jantar com alguém aos meus pés ( o que poderia ser um bom augúrio... não fosse o jantar ser só para mim e o ser aos pés ter quatro patas e pêlo a mais...) como já é hábito e lembro-me de aqui há uns dois anos alguém me dizer "Ah e tal porque é que não arranjas um cãozito?"... E eu responder... "Irra ainda não estou assim tão encalhada!!...acho que esse deve ser o último reduto... Eu ainda só estou encalhadita, vá... "
E, pronto, é isto... tenho a pintarolas enrolada nos pés. Valha-me o rir-me das minhas próprias parvoeiras...


Irrita-me já não escrever como dantes, dói-me como se me tivessem arrancado um bocado de dentro de mim à dentada, e a frio. Irrita-me porque sei que não escrevo assim porque já não é para ele que escrevo, já não é para ninguém que escrevo, escrevo para me falar, só. Não para me dizer a alguém. Só para mergulhar em mim e chegar-me a sítios onde não me chego se não estiver fechada dentro duma folha em branco com palavras. Uma dimensão de mim que agora só existe em palavras, em sons, em sorrisos por dar e palavras guardadas por dizer. Um a dimensão de mim que morreu e respira pelas palavras e suspira entre virgulas, agarra-se às reticências como a uma cura por vir não prometida.
Às vezes vou passear por outras vidas, vidas minhas que já não são, vou ler-me e surpreender-me com o que dantes me saía dos dedos da alma, e há uma revolta daninha no peito que me esmaga por já não saber escrever assim, de já não sentir assim, de já não ter a quem entregar as palavras para me saírem assim. Leio-me no passado e espanta-me terem saído de mim, e entristece-me que tudo tenha sido para ele, dele, e que nunca nada tenha sido suficiente. Se o melhor de mim não chegou, se não chega nunca a ninguém, para que sirvo eu? E agora ainda mais, amputada de sentires e de palavras, que se não as tenho sem ele, eram dele. Se não fossem dele não desapareciam com ele - e a revolta esmaga-me o peito ao ouvir-me por dentro, por sentir, por perceber isto; revolta que não se domestica nem acalma. Se fossem minhas as palavras, ainda as tinha a lavrar os dias como quem lavra o vento, incessantemente, pelas velas enfunadas da alma. 
Fecho-me dentro de palavras antigas e vejo que havia uma parte de mim arrendada, ou talvez tomada de assalto, invadida, que era dele, era ele em mim antes de o saber ou conhecer, habitava-a  e habitava-me, e eu que pagava a renda, religiosamente, todos os dias com amor, com ternura, com desejo, e ainda assim fui despejada. Despejada de mim, despejada por ele, sou devoluta de mim mesma. Quero habitar-me, devolver-me, apropriar-me de mim e das palavras que me espelham, que me são, que sou. Quero ser casa própria em todas as assoalhadas. Não quero ninguém em mim que me seja mais eu do que eu.



Se calhar a simplicidade mais pura, mais feliz, é quando se está sozinho. Estava a pensar nisto quando à tarde num passeio a seis patas pelas redondezas me deparei com esta frase da fotografia. Faltava-me aquele bocado... quando se está sozinho sem inquietação. Sem solidão. A solidão é a falta de alguém, de alguma coisa, e toda a falta que corrói é o espaço duma inquietação. 
Se calhar a simplicidade mais pura, mais feliz, é quando se está sozinho em paz.

[fiquei a pensar que àquela frase só falta o "n" em reinventar, mas que, de resto, está lá tudo. Agora quando a pus aqui fui pesquisar a autoria da frase (quem teve a indecência de a pôr lá, teve mais decência intelectual que muito pseudo-intelectual erudito por aí, que não põe aspas no que não é seu..) e descobri que é de Vergílio Ferreira, no livro "Alegria Breve", que não li. Gosto muito do que escreve, um dos volumes do seu "conta-corrente", é meu livro de cabeceira, para reler às vezes numa página aleatória, há vários anos, porque faz-me pensar. Como esta frase acabou, completou, o que vinha a pensar no silêncio doce dum passeio de domingo vagaroso a seis patas e muito sol.]

domingo, 16 de abril de 2017


A danada a roer-me uns chinelos...
A danada apanhada, já sem o chinelo nos dentes...
A sacaninha com ar quase arrependido...
... Mais um domingo de manhã, daqueles domingos com aquelas manhãs que duram até quisermos, duram quase até à noite. 
Há dias em que só me apetece ver o sol passar da minha varanda. Eu passeio os olhos pelo passeio dele e ele passeia-se-me na pele. E durante estes passeios, às vezes, consigo não pensar em mais nada... E então a alma descansa, domingueira.


sexta-feira, 14 de abril de 2017

...então boa Páscoa. 
... mas vejam lá, não cansem demais o(a) coelhinho(a)...
;))


Clarice Lispector, in Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres

Adoro isto.
... Talvez fosse bom experimentar essa silenciosa alma animal.

"Ter uma inteligência mas não entender"; "ter loucura sem ser doida"...
E sempre que se pensa que se entendeu algo, usando a inteligência, então, entendemos errado. Quase sempre. Compreender é sempre errado, não ousar entender é ousar nunca errar. Adivinhar, pressentir, sentir saber pelas sensações sem qualquer razão, adivinhar, é uma espécie de curto-circuito, como um amor correspondido para Beckett... É raro, mas não será impossível. A vantagem do impossivel é que nunca se prova. 

quinta-feira, 13 de abril de 2017


Se precisas de um beijo hoje para que a tua realidade pareça inteira,
 hoje é o teu dia.
Se beijas para que os dias te sejam inteiros,
todos os dias são teus.


[e se alguém se perguntar o que raio faz esta foto a ilustrar um post no dia do beijo (dizem que é internacional o dia e tudo...), eu só posso alegar, em minha defesa, que há coisas que não se explicam; se alguém não as entende sem explicação, não há explicação possível que os faça entender que há olhares que nos beijam de tal forma que a alma resplandece em sorrisos assim, como o da foto: a que não tem beijos.]

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Jean-Luc Godard (une femme mariee)


"Sabes, ainda vejo.
Aquele indicador esticado, a enrolar e a desenrolar, o cabelo negro, enquanto lês O. Wilde no sofá, a mostrares as pernas, dobradas, com a minha camisa vestida.

Sabes, ainda vejo.
Aquele olhar, verde, penetrante, cortante, as pupilas dilatadas, as pestanas ainda maiores, que só acabava no quarto, com um suspiro.

Sabes, ainda vejo.
O morder do lábio, em gesto nervoso, sedutor, de quem me quer falar, confidenciar, um pensamento ou um desejo.

Sabes, ainda vejo.
O sorriso, maroto, terno, em busca da minha indignação porque não sabes comer esparguete.

Sabes, ainda vejo.
A pasta dos dentes aberta, porque tu nunca, mas mesmo nunca, a fechavas.

Sabes, ainda vejo.
E sinto. As tuas mãos no meu rosto, quando eu definhava, e tu, fria e assertiva, me gritavas "viver é a coisa mais rara do mundo, a maioria das pessoas apenas existe.", do teu querido O. Wilde.

Sabes, ainda vejo.
Os dias que eu nada dizia, ou quando por tudo, ou por nada, tu vias-me, tu sabias adivinhar o meu pensar, e fazias gala nisso.

Sabes, quando o teu cabelo passou a negro brilhante, o verde dos olhos ficou maior. Sabes, só de olhar-te, a dormir, como dormem os deuses, eu tinha tudo.

Sabes, é claro de sabes. Afinal dei-te tudo.

Sabes como sei? Porque não esqueço, que o que escrevi, disseste-me tu ao ouvido sobre mim, no dia que partiste.

É curioso. Sabemos que estamos perante uma das mulheres da nossa vida, como amiga, ou amante, quando lhe reconhecemos as pequenas coisas do dia-a-dia, e gostamos dos seus pequenos gestos e trejeitos.
Sabemos da importância de alguém, quando esse alguém, nos olha, e sabe, sem nada dizermos, o que se passa cá dentro, o que nos corre no íntimo, sem ser água ou sangue."

conta corrente (aqui), in como olho e as vejo
(lá saiu dos rascunhos, CC)


" só de olhar-te, a dormir, como dormem os deuses, eu tinha tudo"...
...mas sabes, nunca tive nada. Nada de ti, nada teu, nada que me quisesses dar, a não ser o lugar de alguém que tinha tudo só de olhar-te dormir, não tendo nada, não querendo mais nada.

Sabes, estou forrada de memórias de pequenas coisas, em que cada uma é maior que eu, cada uma dessas pequenas coisas, mal me cabe se as recordo,
...mas sabes, nenhuma és tu, nenhuma é tua, nenhuma é sequer pedaço de ti, são todas minhas, em que te imaginei do tamanho dessas pequenas memórias que me forram e transbordam, em que a mais pequena mal me cabe de tão inteira - ou de tão inteira me fazer.

Sabes, eu sempre te disse que fui tua, que desde que tu és tu para mim, sempre fui tua,
...mas sabes, não fui, eu fui de quem me entreguei sem saber, quem me foi tomando o olhar e a pele sem licença, e sem dar conta de não ser precisa licença para me invadires - porque de tão meu, deixei-te entrar como se fosses. Meu. Como eu.

Sabes, o tamanho das coisas que vemos está no nosso olhar, e os meus olhos a ti viram as tuas pequenas coisas com a imaginação do que nunca foste, nem fizeste, nem quiseste fazer,
... mas sabes, fizeste-me sentir - o avesso escondido dos teus pequenos gestos, das tuas pequenas  doces sombras, foram-me sempre enormes, avassaladoras de vida. Foram-me tudo o que tu me eras. Agora já não sinto que sinto.

Sabes, às vezes, ainda sou dessa imaginação, ainda sou uma das mulheres da tua vida, aquela de quem notavas os pequenos jeitos e trejeitos, como eu ainda vejo aqueles que em ti imaginei,
...mas sabes, disseste-me que podia ter sido a mulher da tua vida, podia... se podia, falhaste em imaginar o mesmo que eu, não me sentiste como te senti, como se tu  já fosses parte de mim antes de nós, e sempre continuasses a ser, porque não havia depois. Não havia depois de nós. Não havia, mas houve, mas há.

Sabes ainda me pergunto o que imaginavas tu, quando, no silêncio, eu imaginava que te adivinhava  e me adivinhavas só por nos olharmos,
...mas sabes, o que vemos é do tamanho do nosso olhar e tu nunca me chegaste a ver. 




Quando vi isto e guardei, lembrei-me do Moon... Hoje passei outra vez por ela e deixo-a aqui.

Se a alma hoje me viesse para o lado de fora eu estaria coberta de tempo que passou, muitas camadas diferentes de tempo - os passados são tantos e voltam tanto. Muitas texturas diferentes porque eu sou muitas, eu sou tantas e todas essas que sou me trazem passados que se multiplicam como feridas que abrem na pele de fora para dentro. Abrem, e há dias que crescem.
Hoje o sol não me aquece, a luz não resplandece. Não encontra eco em mim, ainda que toda eu seja paredes.
Hoje vim a viagem em silêncio, cheia de vontade de música. Daquela música que nos dá vontade, vontade de ter vontades, que faz o corpo começar a ondular, o sorriso a dançar e os pés a gargalhar, sem a cabeça dar conta. Hoje queria que a cabeça não desse conta de nada. Que a alma se colasse à pele, que que se colou à música que dançou sem saber... Mas não havia música. Queria que a alma ficasse quieta por trás da lua que não se vê, até ao dia em que se veja o brilhante da lua e o seu avesso, tudo ao mesmo tempo, tudo a um só tempo, como uma só. Como se só houvesse agora.

... Mas isto não era para nada disto, era só para dizer que me ainda bem que o Moon voltou :).... o resto escapou pelos dedos do tempo que me escapa pelos dedos.


terça-feira, 11 de abril de 2017


[foto @olheosmuros]

Isso!...
E mandem os currículos para aqui, sim?
(Que a falta de experiência não seja motivo de acanhamento, será providenciada logo logo...)
  

segunda-feira, 10 de abril de 2017


[Auto-retrato de Almada Negreiros]

"Encontrar sem buscar é coisa difícil e rara: achar aquilo que se busca é cómodo e fácil; ignorar e buscar (aquilo que se ignora) é impossível." - a frase que me fez tirar a fotografia, diz hoje tudo o que eu não consigo dizer  (acho que também faria parte do meu auto-retrato de sempre  -se o tivesse-, mas dos últimos dias, especialmente. O auto-retrato não são só traços de fisionomia, como me parece que este ilustra tão bem.)

domingo, 9 de abril de 2017


... Engraçado como a lua parece trazer a clarividência fria do que está (ou estava) oculto. E, no entanto, já houve tantas luas antes desta. Talvez eu ainda estivesse demasiado quente.

sábado, 8 de abril de 2017


Eheheh...
... E que belo dia para isso!!
(o sol é provavelmente o melhor antidoto para a melancolia...)

sexta-feira, 7 de abril de 2017


Irra que estão grandes!!.. As duas! Devia haver uma cláusula de proibição de crescimento a partir dum momento escolhido por nós... A patuda daqui a uns três meses está quase no tamanho adulto, a pezuda daqui a cinco anos começa a apresentar-me namorados (só tem autorização a partir dos quinze por isso só mos apresentará a partir daí...), vai começar a namorar primeiro que eu, já dizia um amigo meu cheio de sabedoria... Bahhh
E ainda por cima estão de férias a curtir o jardim inundado de sol... E eu entre quatro paredes... Buaaaaa... É injusto...
O que de mim destila
escorre em formas de ti
Tu vazas secura
Para que não sou vaso
Não guardo nada de ti
Escorres-me em palavras
Num rio
De que já não és mar
Palavras a que já não chegas
Dum lugar onde sempre fui partida
Nunca chegada
Nunca destino
Já cheguei onde não estás.
Ainda que me habites,
Já não te procuro onde não estou.
Escorres-me em palavras, só.

quinta-feira, 6 de abril de 2017


Dou por mim a pensar que a minha capacidade de síntese equivale à capacidade sprint dum caracol que não se babe (suponho que ainda andem menos depressa que os outros, né?...). Até na resposta aos vossos comentários escrevo várias vezes (muitas) várias linhas... espraio-me nas palavras como quem estende a toalha na areia dourada duma praia cheia de tempo e de caminhos e de conversas solarengas à sombra das palavras já ditas. Umas palavras - as vossas - trazem ideias e outras palavras agarradas, e, depois, não sei, juntam-se e parece que se multiplicam, e eu, de nada, escrevo parágrafos inteiros... não sei bem como nem porquê, acontece só, como quem desenovela o que já está estendido...  Não é normal, as pessoas normais só têm uma ou duas linhas de comentário. Acho que não sei comentar. Mas não digam a ninguém, que na ignorância desta minha incapacidade nós vamo-nos  entendendendo, sim?

      [imagem @trechosdelivro]

Há tantas metades em mim
Sou meia em tanta coisa
Meia doida
Meia racional
Meia destravada
Meia lógica
Meia complexa
Meia simples
Sou demasiadamente feita de metades
para me voltar inteira. 

E no meio de tanta volta
Pouco me mudo.


terça-feira, 4 de abril de 2017

Dias há em que é uma bênção ter números por perto, estar rodeada de números cheios de papeis, ou papeis cheios de números cheios de razões e outros tantos erros escondidos à espera que os descubra. Como hoje. Dias em que os números me cercam os pensamentos e cerceiam os sonhos, não os deixam vadiar pelos momentos que se arrastam a pairar em vidas enterradas. Há dias como hoje em que adoro mergulhar nos números para asfixiar as palavras que me enrolam o coração, porque os números batem certo, entendo-os, mesmo que não goste do que dizem. Têm lógico, têm um fio condutor, se o soubermos seguir descobrimos erros e descobrimos a verdade. As palavras não têm verdade que não a do seu dono, e mesmo essa tem dias... dias como hoje.
A verdade é que esta hora, em que a luz vai poisando nas coisas, lânguida e vagarosamente, é um convite descarado e atrevido a conversas e silêncios de tons quentes e sorrisos abertos. A verdade é que é sempre uma hora que suspende o tempo em momentos. Os números desvanecem-se entre os dedos do sol que vão deslizando pelo céu até descansarem no colo do horizonte, onde dormirão quentes, até amanhã. E eu sonho com um horizonte feito colo, em tons de pôr do sol e silêncios atrevidos...
... mas acordo,de volta aos números (quase lado a lado não ao colo...), que há coisas para acabar... 

??? Is there?

Limpo o pó ao coração para dentro duma nuvem branca pendurada na janela para que às visitas pareça que a casa está limpa, cuidada, quase imaculada.
Escondo as feridas debaixo do manto da noite para o dia não as ver por sarar. Quando a noite foge para longe de mim entretêm-se com a poeira das estrelas enquanto entretenho as visitas.
Às vezes à pele colam-se-me resquícios de memórias de que me esqueci.

segunda-feira, 3 de abril de 2017


... Das coisas (parvas) que eu sinto falta... não de que me batam no rabo, que detesto, prefiro que agarrem em vez de bater, é menos bélico e muito mais interessante, digamos. Mas o que sinto falta mesmo é de responder a uma frase destas com um "hum. Acho bem!!" e um sorriso enorme por dentro, e com alguém, a essa altura, por dentro dos braços... Também sinto falta daqueles abraços de corpo inteiro, de braços e pernas e tudo o que der, em que apetece ser polvo para ter mais braços com que envolver o que queremos não deixar escapar, o que apetece apertar para fazer nosso... Outro género de cartas de amor que não deixam de o ser. Também gosto das outras, desde que verdadeiras, espontâneas e que falem uma "nossa" língua, como estas coisas, assim.

domingo, 2 de abril de 2017


Primeiro café desta primavera tomado na minha varanda. Primeiro café tomado com a patuda ao sol, na varanda que lhe estava interdita porque ainda cabia nos espaços que dariam para um mergulho no nunca. 
Fico-me aqui, na preguiça vestida de pijama a ouvir os sons das imediações. Há pássaros que chilreiam, carros que passeiam, bombos e vozes que cantam ao fundo (??? O que será?), esquinas que se fazem surdas ao tempo, passos desaparecidos que nunca olharam para trás. E eu aqui, a olhar em frente,  a ver gente dobrar esquinas e descer ruas que não se sobem. Já não se sobem, o tempo nunca se dobra. 
Às vezes colecciono palavras, ponho-as alinhadas na mesa que há dentro da minha cabeça, tem tampo de madeira ruiva a minha mesa montra de palavras. Disponho-as e disponho-me a lê-las, não as letras, a alma das palavras, deixo-as conversar com as minhas. Arar os sentidos para chegar à essência - provavelmente a minha, e só a minha, através da delas. Hoje saltaram-me à vista as palavras raras como as pessoas consistentes, à prova de contrário,  direito à prova de avesso. Rompem a ilógica lógica do avesso, do sentido oposto ao certo que assim não é errado. 
As palavras dispostas, bem dispostas alinham-se em mera aparência de desalinho, e eu aprumo o sorriso na trama que tramam:

ana
ama
ara
seres

ele
ala
ata
saras

ses

Gosto de palavras, gosto destas palavras, porque são espelhos de si mesmas, simétricas e fiéis; porque se as partirmos ao meio restam-se em metades iguais. Gosto de algumas palavras sem razão de gostar, gosto só porque sim, vejo-as junto ao canto da mesa quase a cair em si de mim... gosto da palavra desejo, de como soa, de como a boca o diz, de como anda como se desfilasse, de como corre e ganha terreno debaixo dos pés, por dentro da pele; como gosto de ensejo, como quem arqueja e flameja à ideia duma ideia, como quem estende os braços para o devir e sente poder fazer acontecer o que ainda não se vê, o que ainda ninguém viu; como gosto da palavra sussurro por ser meiga e falar baixinho cheia de açúcar arrastado, como me aquece o conforto passar pela palavra aconchego que se me enreda no calor da pele, e apego por não querer largar e quem não quer largar quer alguma coisa que tem medo de perder, mesmo que não tenha coragem de o dizer nem a arrogância de se impor,  como gosto da palavra alma que me aparece como cor, como véu diáfano que envolve sem tapar, que deixa ver sem mostrar, dum azul esverdeado acinzentado, não tão simplesmente azul nem sequer verde reluzente de vida, nada cinzentão de apático desmaiado, mas sim como os olhos do mar... adoro a palavra mar, evoca-me amar, chama-me pela boca e leva-me pela mão, salga-me a pele e adoça-me os lábios, leva-me no prefixo perfeito que completa a imensidão que liga tudo...  que ondula, que tem marés, que se revolta, que engole tudo em tempestade, mas que em maré nenhuma deixa de lamber a pele da praia. Consistência e persistência, mesmo que tenha ondas, vagas, marés e tempestades, o seu lugar não deixa vaga - é um sítio inteiro.
Subo do mar ao rio, rio-me com a escalada nas palavras. Mar e rio: uma é filha da outra e nenhuma tem contrário falta-lhes o avesso para saber o direito. Quando não há avesso, haverá direito?...Pergunto-me enquanto arrumo a mesa e lhe desembaraço os cabelos ruivos de feiticeiras palavras... E as letras emaranhadas nas mãos continuam a tagarelar-me... O mar tem mãe, mas o rio é filho do céu, que tem todas as cores da alma. O mar reflecte-as. 
Sem ses. 
Ama. 
E quem ama tudo sara.

sábado, 1 de abril de 2017


E hoje é dia de vacinas desta terrorista, e devia ser o dia de cortar o pelo, mas o meu. Também devia ser dia de sol para arranjar a minha varanda e fazer as últimas exéquias às plantas que o inverno levou... Mas mesmo, mesmo, é dia de preguiça, de sentar no sofá sozinha e olhar para a bichinha a saltar em modos cabrita, a atirar os bonecos ao ar para os ir apanhar como se não soubesse onde caíram, dia de ir catar coisas que eu não sei que tenho em casa e trazê-las nos dentes com aqueles olhos "mas o que é que foi agora? De que reclamas tu?" Enfim... É dia de ronha. Até o sol anda a fazer ronha, esta mania de ficar sempre, tímido, no banco ao fim‑de‑semana não pode ser, prejudica a assistência ao fim‑de‑semana ...  Acho que fora a vacina, vai ser dia de café com a terrorista ainda ao colo, trocar umas compras (que provavelmente com esta vontade toda, vou adiar...) e depois cinema de sofá... É a vantagem de ter uma amiga cinéfila que me vai dando bons filmes para ver no sofá, compra todos os que gosta para ficar, depois empresta-me... 
Eu sou tão preguiçosa que ronha devia ser o meu nome índio ... 
Bom dia.