quinta-feira, 9 de março de 2017





aterrorizado outra vez
de não amar
de amar e não seres tu
de ser amado e não ser por ti
de saber e não saber e fingir

e fingir

eu e todos os outros que te hão-de amar
se te amarem

a não ser que te amem


Samuel Beckett

[e é verdade que isto é mesmo assim. aterroriza não voltar amar, aterroriza pensar em amar e não ser ele, enlouquece pensar ser amada e não ser por ele, como se o amor fosse um artigo com defeito que queremos deixar na prateleira, queremos livrar-nos dos empecilhos que nos enrodilham os dias à volta do coração. e ao livrarmo-nos dele perdermo-nos do coração que nos faz pulsar a cor na respiração dos dias. mas, depois penso, quem esteve - quem está - sempre a enfeitar a prateleira, sou eu. o defeito deve ser meu, o artigo defeituoso sou eu. então finjo que não sei que fingiu que me amou, finjo que a prateleira não é minha. que eu fui dele e serei de alguém - e não a fingir. dá-me vontade de fugir o fingir, mas se ao menos a fingir me tivesses tentado alcançar... se ao menos a fingir eu acreditasse não perder a melhor essência de mim junto com as memórias que quero despejar do coração para a vala comum dos desamores. despejar-me. depois onde me resto? de que me faço?]

4 comentários:

  1. Colocas aqui uma questão que me ponho a mim todos os dias. Vou fingindo que a vida sorri e que tudo se encaminha sobre rodas...


    bom dia Olvido

    -___-

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  2. .. também eu Moon, pode ser que um dia esteja tão convencida disso - que a vida sorri e isso de tudo sob rodas - que quase o sinta...

    Boa tarde :))

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  3. Olvido, é algo mágico retornar à leitura dos meus antigos blogs predilectos e verificar como ainda há alguém como tu, inspirando e atiçando a nostalgia de purgação deste género de recanto.
    Um beijo enorme, imensamente grato!

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  4. ... Tantos elogios juntos :) obrigada. É bom saber que gostam de nos ler e que se lêem também no que nos sai da alma pelos dedos...
    E, sim tens razão, este recanto é talvez de nostalgia da purgaçao, é uma bela expressão essa, Eros :) mas tento que vá sendo também de outras nostálgias, de algumas esperanças, de alguns risos também... Ainda não estou lá, mas espero chegar-me lá.
    Grata, digo eu :)
    Bom fim‑de‑semana, Eros

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