Aqui da minha cama, deitada, vejo a luz da varanda do vizinho. Uma luz ténue, amena, quase gentil. Ontem à noite adormeci com a luz a entrar-me no quarto pela janela, virei-me de costas para ela, a parede parecia iluminada de luar brando. Mas eu sabia que não era da lua, que era só o candeeiro da varanda do vizinho de trás. Gostei na mesma de ver a luz pintada na parede, como que me acalmou e guiou o adormecer, mas eu sabia que não era o prateado da lua que me banhava o quarto. Há quem depois de ver o candeeiro continue a dizer que é a lua, a negar a existência do candeeiro, a fechar os olhos à realidade. Eu não, eu gosto de ver a realidade, de saber as origens e os porquês, e depois gostar ou não. Da realidade. A luz do candeeiro do vizinho também é bonita na maneira como se desenha na minha parede, gosto dela, e gosto mais de saber que gosto dela, mesmo que não seja a mítica e apaixonada lua a entrar-me, perfeita, com os seus véus diáfanos de luz pelo quarto dentro. Gosto de saber que gosto da realidade, tenho um fraco muito forte pela verdade. Gosto de saber a verdade sempre, depois decido se gosto dessa verdade ou não, mas negá-la, disfarçá-la, escamoteá-la, menti-la, para me permitir gostar, não é gostar do que se tem ou vê, é gostar do que não se tem e não existe. É um desperdício vazio. Há quem vendo uma luz goste de saber donde vem, e também há quem goste tanto de dizer que é a luz romântica e doce da lua, que fecha os olhos a saber das suas origens, e se, por acaso, não os fecha a tempo e vê, finge que não. Que não viu, que não é. Dizer que é o luar que nos embala o sono parece muito mais bonito... A mim parece-me que não sabem gostar nem do luar que a lua vaidosa nos derrama, nem da simplicidade duma qualquer luz que nos aconchega o adormecer. Parece-me que misturar tudo, fazer como se tudo fosse o mesmo, enganar, falsear, é não saber gostar de luz nenhuma afinal. É não saber distinguir nem apreciar cada beleza. E não saber isso é não saber nada de beleza. Nem de verdade. Nem de gostar. A beleza é sempre uma verdade, mesmo que nem toda a verdade seja beleza.
E por causa do candeeiro do vizinho e disto tudo lembrei-me duma frase: " depois de se abrir os olhos nunca mais se consegue fechá-los da mesma maneira. Nunca mais é como antes de se ter aberto os olhos." Mas é mentira, há pessoas que depois de os dizerem abertos dizem a seguir que afinal nunca os tiveram fechados, fica tudo como dantes... Afinal o luar é tão bonito a estender-se na parede dos quartos, enquanto nos embala os sonhos que o sono nos cede quando fechamos os olhos.
ResponderEliminarQue bonita imagem essa do candeeiro!
Sim, depois de se abrir os olhos, podemos até ver tudo ou quase tudo de olhos fechados se mantivermos, obviamente, o senso da realidade.
Querida Vi, gostei muito do texto, dos detalhes e do percurso dos teus pensamentos. Deu até pra ver os arabescos de luz e sombra projectados na parede:)
Beijo,
Nanda
... É verdade o que dizes, nanda, depois de abrirmos os olhos somos capazes de ver as coisas até de olhos fechados, como se então já as conhecêssemos... Mas então para quê fechá-los, ou fingir que os fechamos, e que nada mudou, que tudo está exactamente como dantes? Para quê dizer que é luar se já vimos o candeeiro? Seremos mais felizes se nos enganarmos? E seriamos mais felizes se a nossa luz fosse luar? Quando tão poucos, se calhar, as sabem distinguir?... Muitas perguntas, demais e diferentes... Com tantas interpretações... Nunca nada se sabe verdadeiramente... Só sabemos verdadeiramente quando estamos infelizes... talvez, nem isso é certo se calhar.
ResponderEliminarBeijo :)
mas a luz do luar nã é uma verdade... apenas uma reflexão :)
ResponderEliminarManel, então e uma reflexão não pode ser uma verdade? Essa é a verdade: é uma reflexão da luz do sol, é o luar. É uma verdade!.. não?
ResponderEliminarEnganamos a nossa mente tão bem...mas tão bem, que até ficamos parvos como o conseguimos fazer...continuo a ver a Lua todos os dias, lá no alto, mesmo sabendo que está noutro canto do mundo!
ResponderEliminarboa noite
-___-
Hummm... Tu não a vês lá, tu sente-lá lá ;)
ResponderEliminareu não gosto de me enganar, quando ando enganada, ando mesmo, genuinamente. Posso até fazer figuras tontas, posso até escolher ser estupida, posso até dizer que a luz do candeeiro me serve melhor o adormecer, que gosto mais, que nao preciso, nem quero, a lua, mas conscientemente, é escolha minha.
Acho que não faço isso de me enganar como modo de olhar, e detesto que mo façam, porque tiram-me a liberdade de escolha, enganam-me... E isso é coisa para me virar ao contrário...
Boa noite, Moon :)