sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Ponho-me a pensar neste ano, aqui em frente à chávena de café, já vazia, poisada na mesa da cozinha... Passei o ano sozinha com a miúda com vista para a ponte e fogo de artifício, só as duas. Tínhamos jantado com os meus pais, não os quis deixar sozinhos na entrada do primeiro ano sem um de nós, jantamos e fomos ver o fogo à meia noite, quando regressei a casa lembro-me de abraçar o choro com a minha minha mãe por dentro, de chorarmos as duas, assim, sem dizer palavra, estando tudo dito. Entrei em casa, olhei-a, e soube o que ela estava a pensar, isso doeu-me muito, tudo doía muito, eu saber e não poder fazer nada. A não ser abraçar o silêncio com ela dentro, aconchegada. O ano passou, assim, sem dar grandes ares de coisa nenhuma, passei uns dias sozinha no Alentejo, que me souberam divinalmente à alma, com uma chuva de estrelas vista à beira da piscina com os olhos mergulhados no infinito, que às vezes também cai. Lembro-me de contar onze estrelas cadentes e depois deixei de contar. Talvez, como na vida, depois de certa altura, que nem sabemos dizer qual é, deixamos de contar, de fazer contas, de planear, recostamo-nos e apreciamos apenas. Essa deve ser a melhor parte, mas ainda não cheguei lá...parece-me. Depois seguiram-se as férias que deveriam ser dos cinco, tenho tentado juntar o resto que resta de nós nas férias, mas a vida mete-se no meio dos planos para os azedar, baralhar ou inovar, nunca se sabe à partida, desta vez foi para separar. No meio do Gerês, num lugar de sonho, longe de tudo, não quiseram arriscar o pesadelo duma urgência e fomos só os três, eu, a pequenitates e o irmão que me resta. Sempre com um olho na tranquilidade da vista e outro no stress da chamada de quem ficou do outro lado. Foi bom, apesar de tudo, gostei da paz, dos pequeno almoços que arranjava para todos na mesa cá fora, cheios de tempo e de vistas. De sons com dons de não perturbar o silêncio. Gostei muito da casa, adorei os passeios, de sentir que faça o que fizer há coisas em que somos completamente do mesmo sangue, e isso é bom. A única coisa boa no meio disto tudo é que estamos mais próximos, mais juntos, mais família ainda que sejamos menos. Com muita ou pouca família, eu gosto dela junta, por muito esquisita que seja, por muito doente que seja, como dizia alguém. Aceitar-me é aceitá-la e aceitá-la é aceitar-me. 
Depois das férias aquilo, mais uma decepção, mais uma punhalada, mais uma desconsideração, mais um chorrilho de mentiras, mais uma vez, e incrivelmente, sem o sentir como novidade. Magoou, magoou outra vez muito, mas magoou pela última vez. Não teve resposta, nem eu vontade de a dar. Foi tudo demasiado mau. Enfim, acho que serviu para lhe sentir raiva durante algum tempo e quando passou, restarem apenas mágoas demasiado repisadas e felicidades que ressacámos demais e muita vontade de esquecer. Vontade de distância do que me magoa, do que sempre me magoou, afinal. De me esvaziar, de ser um lugar por ocupar em vez dum lugar ocupado de vazio sem saber. Estava eu nesta vontade imensa de afogar esta história num sítio morto de mim, e a consegui-lo, quando me aparece alguém que me arranca sorrisos de sol. Assim, depois de sete anos sem ver nada que me despertasse, entra-me alguém pelas frestas da vida como o sol da manhã pelas janelas fechadas. Alguém que me traz margaridas no amanhecer e frases banhadas a luar a qualquer hora do dia. Foi bom e foi curto, demasiado curto, mas valeram as gargalhadas, as conversas de horas, as margaridas que me enfeitaram os sonhos e o ver que me podia encantar... Mais: que me queria encantar. Acabou, não se olhou para trás, ninguém olhou, o que ficou ficou, o que era para ficar ficou. Ficou principalmente, talvez, um tico de esperança para acreditar que às vezes uma pessoa ainda se encanta. E que há desencantos que não nos dilaceram tanto. Pela primeira vez alguém passou pela minha vida quase impunemente, deixou pouco, levou pouco, mas valeu a pena. 
Agora estou aqui a pensar no que passou, no que vou fazer da minha vida para o ano, no que vai ser de mim, dos meus todos, de tudo. E não sei, mas na verdade não tenho vontade de saber, o tempo vai-mo segredando na pele enquanto me arranha os dias e sonha as noites. Não quero saber e, mesmo não querendo saber, saberei. Com tempo.

2 comentários:

  1. Parece uma frase feita, dizer, "aproveita o que a vida te dá de melhor!", mas cada vez mais tenho a noção que deverá ser assim mesmo!

    Bom ano (com mais risos)


    boa noite Olvido

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  2. Sim, é verdade Moonchild, temos de aproveitar ao máximo o que temos de bom e tentar focar-nos nisso enquanto tentamos perseguir um qualquer horizonte.
    Bom ano :)

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