segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017


STOP. 
Deixa o resto. 
O resto tudo, tudo o que for resto... E entregam-te as notícias do mundo ao fundo da rua deserta, porque o mundo não te chega à porta e os dias enevoados não te chegam aos calcanhares...
Deixa.


Os olhos abrem assim, as vistas parecem acordar 
amanheceres guardados durante noites frias de estrelas e de mim.

sábado, 25 de fevereiro de 2017

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Era isto (pelo menos de vez em quando, vá...)
mas ao vivo e a cores 
e em tempo real... Já agora que estamos a sonhar...
... E antes de bater com a cabeça na mesinha de cabeceira.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Talvez não seja o tempo,
Mas as mágoas a indiferença o desamor
Que embaçam o teu rosto 
Nas fotografias, que nunca tirámos,
Que eu guardei
Talvez agora, porque me embaçaste o amor,
no espelho também já não me veja a mesma,
Talvez deseje que algum espelho, desembaçado de mim,
te devolva o que és - mesmo.
Talvez...
Talvez espere que o tempo te dê o que mereces 
Talvez já não te deseje
Talvez já não espere nada

A não ser, talvez, a certeza de não te esperar.





Hoje a alma saiu à rua descalça, só para sentir o chão, só para ter a certeza que tem chão, e que os pés são para pisar o chão dos caminhos, que nuvens não fazem caminho nem têm norte nos pés.
Hoje a alma saiu à rua por trás duns óculos escuros, não porque a luz seja demasiada e lhe engelhe os olhos pitosgas, mas porque as olheiras fundas encovam a vontade depois de ter enterrado o descanso há eternidades. Queria a alma poder dormir e não ter medo de luz, porque só a luz faz ter medo do escuro.

Hoje a alma saiu à rua ainda antes de sair de casa e do dia se me enterrar nos ossos, saiu antes de mim, adiantou-se, fugi-me. 
Há uma sombra de mim no chão que não reconheço. Que não me conheço.

domingo, 19 de fevereiro de 2017


[foto @trithemus]

Não deixes fugir a primavera que te assenta à medida da alma
 ou o tempo nunca mais te assentará perfeito no corpo.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

[foto de Robert Doisneau, La douche à Raizeux, 1949]

Dizem que choveu, que ainda é Inverno, 
mas na minha varanda o sol de Verão só fechou os olhos. 
Foram uns instantes.
Há instantes que duram invernos rigorosos e inteiros, 
e eternidades que cabem num fim de tarde de Verão.
 E tu, a que instantes fechas os olhos?

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017


descalço-me de sombras para chegar a ti
as linhas do meu rosto são claríssimas
nelas não vês o velho, a criança, o adulto
vês apenas o traço comum
que é onde eu procuro a tua mão
na transparência da minha palavra inteira.

Vasco Gato

[é onde procuro a tua mão,
nesse vazio frio,
que me deixaste entre os dedos,
que encontro a palavra
desfeita do beijo
que não dei
refaço-a, quente,
numa palavra que beija]

Talvez seja melhor não pôr o tempo dentro do peito.
Talvez seja melhor apagar instantes cirurgicamente.
O peito foi feito para guardar gente
Que não se perde no tempo
Quero um peito sem forro de tempo
Sem franjas de mágoas,
Sem cofre, sem chave
Quero um peito infinito
Onde não há sonhei ou sonharei
Onde não há amei ou amarei
Há sonhar, há amar.

[Laura, fiquei a pensar no teu comentário e afinal encontrei-lhe estas linhas dentro, cosi-as aqui...]

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

[foto @alexandramack22]

Às vezes o tempo embrulha-se-me nos dedos dos instantes
 e eu perco-me de quanto tempo perdi.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Ontem acordei mesmo com aquela história na cabeça, tão vívida, tão real, que só me livrei dela despejando-a em palavras. Depois, ao fim da tarde, fiquei a pensar o que faria ele quando chegasse a casa, se iria mais cedo para preparar alguma brincadeira, se me fazia uma surpresa à saída e íamos um atrás do outro para casa, não sei. Foi essa a conclusão, não sei, não sei o que os homens pensam ou como pensam. Não sei. Nunca nenhum dos que conheci me fez, que me lembre, alguma surpresa assim, alguma maluquice como as que fiz, e gosto de fazer sempre de vez em quando. Gosto de imaginar a cara que farão quando recebem, ou quando vêem, ou quando se apercebem, da surpresa tonta. Gosto de pensar que ficam felizes, ou só a rir, ou com um sorriso na cara. Gosto. Nem sequer sei se é verdade que ficam, mas eu gosto de pensar que sim. Então na ronda de blogs ao almoço o Menino , mais ou menos, respondeu-me ao que é que eles fazem ou pensam fazer, ou melhor, tentam fazer... e ri-me, ri-me com vontade de rir e de que nenhum que venha a conhecer tenha tais ideias fabulásticas!!... 
Há qualquer coisa de paz no frio
Há qualquer coisa de conforto no não sentir
Só confortável depois de se sentir demais,
como uma trégua numa guerra surda e suja
Troca-se a dolência pela indolência,
entrega-se a dor que rasga
pela indiferença que descose 
O frio queima a dor
Talvez tenha de me fazer neve,
ou desfazer.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017


[foto @moniblanco]

O despertador tocou, maldito, como todos os dias que o corpo tinha de obedecer ao carrossel diário. Era o telefone que lhe servia de despertador - hoje em dia serve de tudo -, quando lhe pegou para o calar viu o post-it amarelo "bom dia, dorminhoco noctívago. Levanta-te, seu preguiçosão, mas antes abraça-me com braços de telepatia só um bocadinho bom". Riu-se, ela era assim meia tonta de doce, meia doce de tonta. Talvez fosse por isso que gostava dela, nunca soube porque gostava dela, mas sempre soube que gostava, não havia ponta de dúvida que lhe ensombrasse isso. Gostava e ponto final. Porque sim - a melhor razão do mundo para amar alguém, se não tem uma razão para gostar também nunca a pode perder. A razão é uma coisa que se perde, ou se esquece, ou se arranja melhor... o porque sim, não. Levanta-se, vai para a casa de banho, dá de caras com o espelho cheio de post-its, com frases deles, coisas parvas que se tinham acumulado em risos ao longo dos anos, aquela mania dele de querer parecer que se achava o máximo "eu cá só me encostava ao balcão e esperava, mas pouco", " eu cá sou bom, sou muito bom, sou o maior!!... Vá, canta lá em frente ao espelho". Depois, no meio de tudo isso, leu "muita tontice mas és a minha coisa boa, se aí estivesse ficavas lavadinho que era um mimo, toca a tomar banho, seu porquicho"... e ele a pensar se sorriso malandreco colado aos lábios, onde raio ela ia buscar ideias para fazer tanta parvoeira, mas que as parvoeiras dela sempre o faziam rir, e ao longo destes anos tinha sempre arranjado maluquices diferentes, em dias diferentes que ele não esperava, ou em datas lá deles, ou neste dia. Não sabia onde ia buscar as ideias, ele nunca se lembrava de fazer coisas assim, às vezes começava a pensar mas nunca lhe parecia surgir nada que ele achasse giro fazer... mas ficava sempre cheio de vontade de lhe mostrar que a queria sempre no sempre. Às vezes não sabia se ela sabia. Tomou banho com  sorriso que lavava a alma, vestiu-se, correu para a cozinha, na sua caneca de pequeno almoço, em que pegava todos os dias, estava outro, dizia "bebe-a devagar, alimenta-te, que eu logo como-te mal te apanhe e encho-te de mimo depois. Vem para casa mal te consigas despachar. Beijo. Adoro-te". Ele despachou-se, tinha um dia fora de casa complicado, mas ia na vontade de voltar depressa, de a agarrar, de lhe dizer que sim, que também era assim com ele, dizendo-o sem abrir a boca. E ela entendia, às vezes ele sentia que ela entendia perfeitamente. Agarrava-o na medida certa desse entendimento, os beijos transbordavam de intimidade e cumplicidade só possível a quem está nessa sintonia plena. Antes de fechar a porta olhou de relance o hall de entrada, logo, se entrassem juntos, iriam prender-se ali mesmo, durante um bocado, enquanto os corpos matam saudades um do outro, e de se sentirem completos, plenos, quentes, de conversarem como se sempre tivessem sido mudos, enquanto as bocas se procuram e se encontram em beijos, em pele, em silêncio que geme de prazer e vontade. Fecha a porta, dá a volta à chave, corre ao café por baixo de casa para um café forte, quando o viram entrar já o estavam a tirar. Dá os bons dias, desfolha rápida e despreocupadamente o jornal, bebe o café em pé, pega nos óculos escuros e procura no bolso moedas para pagar, os dedos encontram um papel, tira-o e era um papel pequeno, imprimido com a fotografia que ele mais gostara da brincadeira do ano anterior, as pernas dela. Por trás estava escrito "até paradas correm para ti, para te envolver, para te abraçar, para te prender. Não me fujas" de repente viu uns olhos à sua frente, por cima do bigode, muito abertos a olhar para ele e para a fotografia que ele virara para ler o verso... Pagou e foi-se a rir com a cena até ao carro... Tinha de arranjar uma coisa gira para logo ao fim do dia, não podia ser só ela... Mas o quê? O raça da miúda tinha sempre ideias tão parvas que desaconselhavam competição...
Há pessoas que só são felizes se não tiverem alternativa. Há pessoas que não optam porque não sabem abdicar, não sabem deixar de querer a alternativa, então abdicam da escolha, entregam-na noutras mãos, e só então - pensam - podem ser felizes porque não têm escolha, opção passa a ser obrigatória. A responsabilidade na frustração é-lhes subtraída. O que decidem por eles não lhes oferece alternativa, não têm de, em consciência, abdicar de nada. Nada excepto escolher.
Há pessoas que confundem felicidade com irresponsabilidade na infelicidade.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

... descrente no amor, crente que o amor se resume à poesia que nos cavalga o sangue até ao coração, que fica a correr dentro de nós tempos tão incalculáveis como improváveis, resume-se a romances dentro de livros, de filmes, de músicas que fazem nascer sorrisos de reconhecimento nas letras, que o amor é só uma óptima ficção, mas sonhada, vivida - de forma ímpar - a solo... a solo, não a par. Há um mundo de diferença, um sonho gigante que os separa. O amor, o que todos querem, o que todos apregoam, que é a estrutura de tudo, o que no fim a tudo de resume, aquele elixir de vida que vicia como droga que faz sorrir de felicidade, que faz as cores mais vivas e o coração mais sensível - o que, afinal, todos querem, mas que é apenas um best-seller. Um sucesso de bilheteira. Um produto muitíssimo apetecível, afinal. E há dias em que tenho a certeza que é só um caso de sucesso de marketing, nada mais... Já não acredito no amor, que o amor é a única coisa por que perdemos o medo, por que fazemos o que for preciso se for preciso, que é a única coisa que faz nascer forças das cinzas, que nos faz sermos muito melhores do que alguma vez pensámos. Já não acredito porque na minha cabeça amor era uma coisa a dois, era reflexo e espelho, eram as mãos dadas, juntos no que fosse preciso, para o que fosse preciso. E isto não existe, fazem-nos crer que sim, mas não, é uma alucinação colectiva, com a publicidade mais bem conseguida em todas as artes que nos tocam os sonhos, e que nos vendem esta ideia. O amor é uma coisa nossa, creio que mais imaginação que realidade, mais sonho do que chão onde se caminhe.
Já não acredito no amor, e é talvez por isso que também já descreio na humanidade... Que afinal de contas é dependente do amor, das suas variadas facetas: de compaixão, solidariedade, amizade...  a humanidade depende da capacidade de amar de alguma forma. Humanidade e amor: não há humanidade sem amor, e o amor pleno vai além da humanidade. Sem amor nem gente chegamos a ser, e os animais amam melhor.

[foto @moniblanco]

A vida é tão corrida que parece só conseguir respirar fundo 
no desencontro de dois segundos 
sem tempo.

domingo, 12 de fevereiro de 2017


-O que vês na tua janela, Olvido?
-Frio, disfarçado de esquecimento...
-Não será o esquecimento disfarçado de frio?
-Não, quem um dia sentiu o verdadeiro calor pode esfriar, pode encapotá-lo, mas nunca o esquece. Acredita, eu sei do que falo, baptizaram-me de esquecimento, como quem me deseja um destino com futuro, sem o passado nos pés preso. Estou a fazer carreira em tentar e falhar. Até agora.
-um dia será esquecimento, aí nao terá sequer temperatura, como o vazio não tem. O verdadeiro vazio não chega a ter consciência que existe, se tiver não é vazio, é falta.

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Post "O que vês das tuas janelas?"
Arbustos a espreitar para dentro... Cuscos!

Tapetes brancos para o chão e cobertores de árvores a fazer "pendant" ;)

Salas para descansar os ossos e refrescar as vistas... A ouvir o vento assobiar para o lado, e para a frente e para trás... Está indeciso o moço...

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017


Atravesso os campos como quem passeia pelo seu peito sem voz.
Corpo abandonado, pele em pousio, peito por lavrar de beijos semeados com amor, colheita sempre urgente no desejo quente como sol de verão. Peito desabotoado de quem o proteja de intempéries, que o salve de pragas, que entre e o abotoe por dentro, cada botão a fazer-me casa, num gesto que me toca e me aproxima. 
Assim como quem fecha a porta por dentro e tranca o mundo lá fora. 
Assim como quem se abotoa mudo a um peito sem voz.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017


Está um frio de rachar, acordei com dor de cabeça, levanto-a a custo mas à força da obrigação. Levo a criança, cada vez menos criança, à escola. Paro o carro à porta, vejo alguns blogs em atraso, desisto, rendo-me ao frio. Subo as escadas com os dedos revestidos do branco enregelado do ar, a sonharem vestir uma chávena cheirosa de café quente para derreterem o frio. Faço-lhes a vontade. Procuro palavras que aqueçam, vem-me esta à ideia: aconchego - o melhor antídoto de dias frios e de vida entusiasmada de desânimo. Aconchego de um sorriso quente, aconchego duma gargalhada que abraça, aconchego da ternura num beijo puro, aconchego em palavras doces. Não tenho, só tenho um conjunto de letras que diz o que eu gostaria de ter, brinco com elas e fico-me pelo café, pelo frio derretido nos dedos que escorrem da alma, não vale a pena murmurar palavras que não sabem o caminho até mim... Sorrisos, gargalhadas com braços, beijos, palavras doces.
Aconchego...nem tudo o que me vem à ideia me chega à boca... 

Bom dia

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Cada vez mais me vejo pessoa de rituais, como este que começou sem saber como, tomar um café depois de deixar a miúda na escola às oito e meia. Tiro um café, vou buscar o iPad e sento-me a escrevinhar o que me der na cabeça. Gosto do silêncio, do me deixar aqui só comigo, com o café quente e as palavras por vir. Ponho-me a pensar que gosto de rituais mas pouco de hábitos e desato a discutir palavras dentro da cabeça... Qual será a diferença? É só porque não gosto da palavra hábito, ou da ideia que ela me dá? Como coisa que se faz por mecânica, sem pensar, só com base no costume... No "faço sempre assim", no "fui sempre assim", no "foi sempre assim". Não gosto de saber que faço alguma coisa só porque é como costuma ser feita, ou sequer, por que costuma ser feita!... torna tudo mecânico, sem vida, nem se nota que foi feito ou ficou por fazer, não se chega a sentir o que se faz, ou por que se faz. Um ritual tem só em comum a repetição, mas sabe-se exactamente porque se faz, e faz-se em nome disso, os momentos pesam mais, falam-nos mais devagar, dão-nos prazer ou a sensação de um determinado fim a ser cumprido que sabemos e temos consciência de querer. Um ritual é uma espécie de reverência, um hábito uma mera repetição impessoal. Um ritual é artesanal, um hábito é produção em série. Eu gosto de rituais, deste começo de dia entre palavras e pensamentos com cheiro de café. Quando venho no caminho de regresso da escola, já o venho a pensar, a desejar estes minutinhos, mais meus que maior parte do dia. À noite quando pego nisto é também um hino à minha companhia em silêncio, quando deixo a cabeça falar, quando dou corda ao coração. Quando me apetece sento-me à janela e vejo a noite passear na rua, conversar debaixo dos postes de iluminação, rir nas esquinas das ruas que descem, que tantas vezes foram descidas como subidas, nunca ficaram... Quando o tempo não rói os ossos sento-me na minha varanda, nas minhas paletes pintadas à mão, que tanto gosto, fico-me ali, com um cigarro entre os dedos, a mãos com conversas de coração, a tentar convencê-lo a não ser parvo, mas sou sempre mais parva que ele, acaba sempre por me convencer sem quaisquer argumentos - basta falar, às vezes nem isso, é suficiente o estar calado a sentir-se. A fazer-me sentir.
Não cumpro rituais, desfruto-os.


Ia jurar que eram as suas mãos
Mas de que servem juras,
Se nem as juras de amor 
Passam de injúrias ao coração?
De que serve o amor
Se as mãos são suas 
Sem serem minhas?
Juro que não me servem de nada
Aquelas mãos sem amor.
Nem as minhas.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017


1) eu tenho uma cama para dormir, não um tecto
2) eu já comi hoje, verdade
3) eu tenho um bom coração, é certo que bate menos do que leva, mas ainda funciona (acho eu, espero eu)
4) eu claro que desejo o bem - o óptimo mesmo, tipo eu ou assim ;)... - para o próximo, já para o anterior... 
5) eu tenho água: ao que consta cerca de 70% do corpo humano é água, agora limpa não sei não..
6) alguém se importa comigo... E muito mesmo: os fornecedores!... 
7) eu esforçar esforço, agora não sei bem para quê
8) tenho, antes de as usar pelo menos
9) tenho vários, mas deixei-os todos na pastelaria, estou de dieta... A realidade emagrece que só visto!
10) estou respirando, só não sinto nada do ar que respiro

E agora? Que é que eu concluo? Estou a ir bem? E estou a ir bem para onde?? Para o inferno, para o céu, para o cruzamento mais próximo, para o quinto esquerdo dum prédio de dois andares??? Hum??

Bom dia!!

[gosto tanto daquele slogan simplificador "escolha sua vida"... Como se a minha vida dependesse só de escolha e, dentro da escolha da minha escolha, como se a minha não esteja limitada pela escolha de quem se cruza comigo, como se a minha vida não resultasse também das escolhas dos outros, que me cortam as pernas ou me ajudam a voar, por escolha. Como se se pudesse escolher o que pudesse ser escolhido, como se não houvesse coisas na vida que por muito que se queira não se escolhem, como o que sentir, como as escolhas dos outros. Aceitar as escolhas dos outros não é uma escolha, pelo menos não para mim, mas a minha vida e penso que todas as vidas, dependem de escolhas e não escolhas, há respostas que estão trancadas, vedadas, inacessíveis a qualquer escolha nossa. E tantas vezes, em algumas coisas, penso... Ainda bem.]

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017


Porque nós estamos aqui.
Aqui onde te entrego os meus bolsos,
e - repara - as tuas mãos cabem.

Nós estamos aqui.

Vasco Gato


[O nós é um aqui que tu nunca frequentaste,
onde sempre te guardei lugar,
com a tua mão na minha,
num bolso que guardava o que sentia.
Aqui é um lugar onde a tua mão cabe na minha,
mas onde a minha nunca coube na tua.
Aqui é onde se entrega o que não se escolhe dar.]

(escrito quando senti alguém o lugar de mim)



Nós foi um lugar aqui,
aqui já não é um lugar,
aqui perdeu a geografia.
Aqui perdeu-se no tempo perdido
onde em tudo me cabias
onde contudo nunca te tive cabimento.
Aqui é um tempo que fez tempo
na geografia dos meus afectos.
Aqui nunca te foi agora, já.
Aqui já não é ainda
Aqui foi-me ainda muito depois
do depois de nós aqui ter sido
Aqui já não é sequer depois,
aqui é onde não cabe senão o vazio
do que não foi acolhido nem devolvido,
do que se entregou e não se escolhe dar.
Aqui foi um tempo verbal de amar
sem futuro
com passado no singular
e presente vazio imperfeito.
Aqui, eu sem ti.

domingo, 5 de fevereiro de 2017


Do caminho traçado...

Do que adoça a chuva que não molha mas se sente por dentro...

Do tempo que não chega, da angústia que soçobra nos passeios entre livros... 
Tanta coisa por ler... Tão poucos lidos num universo onde nos perdemos para nos encontrarmos a voz.
Bom dia



sábado, 4 de fevereiro de 2017

[foto @lenagernovich]
.... A tua é maior que a minha!!
Eheheh

Bom dia!
(Hoje é dia de passeio com gente boa, gente de risos e tontices... 
Espero eu, senão vou ser só eu a maluca!)
A menina corria há anos, corria como quem corre atrás da vida que não sabe onde encontrar. Corria até sem procurar, corria à espera que as forças lhe falhassem, que as pernas se cansassem, que um dia o dia não chegasse ao fim. Um dia esbarraram-se, vários dias se esbarraram. Aqueles olhos redindos de mel gostavam de a ver correr, talvez lhe encontrasse uma graça de garça, talvez o emaranhado dos seus cabelos a enredasse num sorriso. Um dia esbarraram-se o suficiente para se olharem nos olhos, num olhar que mediava kms do norte ao sul. Havia um calor doce vindo do Norte que aqueles olhos que não viam traziam agarrado. As mãos afagaram-lhe os cabelos enovelados, mãos que cheiravam aos frutos bons que a terra pode dar, que sabem alimentar vida, abrir caminhos. Sentaram-se no muro que falava silêncios, e falaram sem abrir a boca conversas cheias de palavras sussurrantes de confidências caladas. A menina sentiu perto, mais perto, aquele cheiro de frutos maduros e coloridos, que pedem para serem colhidos para não caírem; as mãos abriam caminhos naquele novelo fechado de cabelos negros, desfiavam com paciência os nós que lembravam raízes emaranhadas, enterradas no tempo, pelo tempo, naquela cabeça inquieta de menina que corre o tempo sem sair do sítio, como se o mundo fosse redondo, como se o tempo fosse infinito. Como se soubesse que se nada mudar tudo é infinito. A cegueira, a dor, a esperança, a vida.
Lentamente, aquela rede intrincada era desembrulhada e a menina, pouco a pouco, como um véu que o olhar despia por dentro - lá onde lhe nasciam os nós que asfixiavam os olhos -, foi vendo a luz ser destapada. Como se o céu só se tornasse azul porque as nuvens fugiam. Sob aquela luz crescente e paciente, os frutos cheiravam a vida, a sol, a nuvens que pintam azul, a doçura que alimenta, a carinho que respira com vagar, até no silêncio falado dos desconhecidos. 
Talvez o mundo seja redondo, talvez o tempo seja infinito, para os nós abrirem caminhos às mãos que não trazem a humanidade extinta. Para sermos gente.

[nanda, foi esta história que o teu mail teceu e eu desfiei para te dizer o carinho :) ]

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

[Foto @ryanmuirhead]

A minha boca grita silêncios sem cor
pelos dedos murchos
dos dias sem alma.
[Às vezes uma pessoa chega a pensar que podemos  ter conseguido mudar alguma coisa, que ainda vale a pena indignar-nos. A dita página "dá-me o prazer de entrar e sair nas pontas dos pés" já pôs em todos os posts - de pelo menos o ultimo mês - o nome dos autores dos blogues onde foi roubar os textos. Vê-se aliás na edição das publicações que o fez há dois dias depois de eu descobrir e mais pessoas terem tido o gesto de contribuir para que se percebesse o que a página andava a fazer... Agora até dizem que como os bloggers se sentiram ofendidos, na sua procura de notoriedade (???), eles vão bani-los das suas pesquisas... Por mim agradeço, só acho que dizerem que contribuem para a divulgação de textos (reparo que vieram cá ler o meu post... boa também esta, hein? até nisto têm de roubar ideias ao que parece..) e autores/bloggers desconhecidos é gozar com o pessoal, não?? Quando maior parte das autorias foram postas depois de haver reclamação de bloggers em comentários que -  os mesmos que dizem querer divulgá-los e prestar um bom serviço - apagaram (WTF???) Uma coisa é certa: há gente com muita lata... vulgo falta de vergonha na cara!! E só por isso já me apeteceu criar uma página do género, mas com links para os blogs, e aí sim fazer pela divulgação de quem gosto de ler, de quem acho que escreve bem, e de quem ainda não conheço e passaria a conhecer pela necessidade de pesquisa... enfim, todos os que merecem ser divulgados e conhecidos... estou farta de gente parva... Desculpem o desabafo, pronto, acabou o assunto.]

...ou talvez eu tenha uma imaginação com demasiadas assoalhadas... 
onde cabe muita gente que não existe,
 a não ser lá e no sítio em que se acomodaram no coração.
Serão, talvez, boas imaginações, 
mas só imaginações...
Bom dia

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

[Foto @ezgipolat]

Quando estou assim, esquisita sem saber porquê,
 pergunto-me o que quero da vida. 
A única resposta que me assoma aos lábios fechados é 
senti-la por dentro da boca até às pontas dos dedos.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Os carris por baixo de mim, como intactos corações que batem compassadamente gastos de caminhos feitos, ficam para além das viagens de quem lhes passa por cima. 
A viagem debruçada sobre o silêncio faz-nos ouvir, nos carris compassados, os corações desenfreados bater à porta de almas por abrir. A paisagem negra do vidro, é às vezes esventrada por salpicos breves de luz. Dão-lhe o contorno, a textura, a fronteira da escuridão. Sem luz a escuridão descobre que não é negra, descobre-se apenas nada. Sem luz a escuridão não existe, não é, não se define. Às vezes é o contrário que nos afirma, e tantas que nos confirma.
A luz surge e logo foge. Foge-nos do quadro, foge-nos da vista, como quem escapa de nós a alta velocidade, deixando pégadas vazias na escuridão. Nós nunca escapamos de vê-las, de tê-las visto, e de terem fugido.
Não escapamos nunca.
Ninguém é esventrado incólume.
Ninguém se descobre ficando na mesma.