[foto @carolinamaez]
“Sempre que penso em ti estás a dançar levemente num clima de canela despenteada, ó aroma vagaroso, desordem aérea, mas a memória tem pressa, o sangue tem pressa interna, e antes de pensar tremo, e depois tremo, pelo meio desenvolve-se o pavor de uma beleza maiúscula, o coração corre entre iluminuras rápidas, é uma criança sucessiva nas pautas da musica, assim escrevo uma nação simultânea, desapareces na respiração do teu vestido, entretanto a revelação anuncia-se pelo medo, curvas-te como as aldeias devoradas pela lua, mais tarde sempre que penso em ti estás com um lenço escrito nas duas mãos, e a tua velocidade abranda junto aos espelhos, expandes-te assim lentamente gravada, és uma floresta de silêncios visíveis, sempre que penso penso sempre ao contrário do fim, estás cada vez mais no princípio de ti mesma, então vejo que nesse lugar é o meu começo eterno, quando danças é um corpo rodeando a brancura rodeada ou de novo qualquer coisa criminal entre o cuidado e o espaço, nas linhas puras da solidão arde a cabeça, arde o vento, atrás de ti as imagens assassinas da noite - estrelas: subversão da noite, sempre que penso em ti danço até à ressurreição do tempo.”
Herberto Helder
Não é dos meus autores preferidos, muitas perde-me no intrincado de metáforas cujas imagens se perdem do sentido do texto, como quem complica para parecer mais complexo, quando a genialidade está em transmitir com uma imagem, em poucas palavras, toda uma complexidade de sentimentos ou sensações, ou para mim é assim... mas há coisas dele que gosto, algumas que gosto muito, e este texto em que bati os olhos adorei. Realmente há alguns vagares que semeiam urgências. É tanto assim, quando as coisas são como deviam ser, ou como eu gostaria que fossem - “um aroma vagaroso” de “canela despenteada”, ao qual dançamos num domingo sem tempo para faltas de tempo, entre os suspiros do vestido que ainda não vesti, mas que irias despir.
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