domingo, 5 de agosto de 2018



(...) “a aproximação, do que quer que seja, se faz gradualmente e penosamente - atravessando inclusive o oposto daquilo e que se vai aproximar.”
Do prefácio de A Paixão segundo G.H., Clarice Lispector

Como o que poderia, ou deveria, unir afastou mais, atravessou o seu oposto - leio estas linhas e é o que percebo, o que penso e retiro, constato, afinal. As pessoas de alma já formada são as que sabem que tudo chega devagar e às vezes pelo lado oposto. A minha será formada? E qual é o meu lado oposto? Por onde me chego pelo meu avesso? Por onde me vejo pelo que não sou?


(Clarice Lispector, in A paixão segundo G.H.)

“A insistência é o nosso esforço, a desistência é o prémio.” - suponho que é verdade, a desistência é prémio quando se fez tudo, quando se construiu, quando se chegou lá e depois de tudo isso, de saber que fizemos tudo, desistimos, não porque fomos vencidos, mas por escolha. Por poder escolher desistir, por ter ganho o direito de desistir. Por ter construído, feito tudo e, também, exactamente por sabê-lo. O prémio é talvez desistir sem (ter de) desconstruir. Talvez. Saber que se conseguiu e deixar ir, qualquer outra forma será sempre o reconhecimento de um falhanço, de uma derrota, se calhar, de termos simplesmente sido vencidos, ou de não termos, sequer, verdadeiramente tentado. Talvez.
Esta não era a página do fim, mas é muito melhor que a do fim. Acabei.

Nao percebo como dizem ser o melhor livro dela... ou se calhar percebo, porque acho que muitas vezes quando não se percebem as coisas dizem que elas são muito boas, como que insinuando que só os muito elevados as podem compreender e, logo, gostar... então muita gente diz adorar e ser muito bom - à laia do que acontece com muita “arte moderna” -,  e eu queria mesmo era perceber como, e se, o entenderam - e já agora, se mo podiam explicar, dizer o que concluíram. Porque há partes boas sim, muito boas, passagens extraordinárias, não nego, mas o melhor livro dela? Há partes que me são incompreensíveis (o problema é  meu certamente, também não o nego, não terei capacidades suficientes) e outras onde acho que se vai contradizendo ao longo do livro. Talvez seja propositado porque é a descrição duma epifania tão longa como uma viagem de várias fases, talvez se vá contradizendo, aprendendo, mudando de ideias... mas torna as coisas confusas e sem lógica ou fio condutor. E eu sem lógica sinto-me perdida, talvez. Há partes do livro em que dei comigo a pensar que ela estava numa trip só dela... e das duras.

11 comentários:

  1. Dizer-se que é o melhor livro dela é muito relativo, é tão mais fácil quando se compreende que não é necessário concordar, basta aceitar pontos de vista diferentes.

    Bom Domingo, Vi:)

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  2. Claro que é relativo, mas quando lês, repetidas vezes, que é considerado o melhor livro dela, é porque há várias pessoas com a mesma opinião... e não é questão de concordar ou não, é desejar que me explicassem o que concluíram do livro para eu conseguir ver tão longe como quem considera o livro tão bom. Não Se trata aqui de concordar ou não com a opinião, isso cada tem a sua, eu queria era entender... porque as opiniões são alicerçadas em alguma coisa, não?
    Bom domingo, Legionário:)

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  3. A solidão dos dias de hoje, faz-nos ter ânsia de nos sentirmos relevantes.
    E, como ainda há pouco presenciava, numa mesa ao lado com muitas pessoas, todas falavam num mais alto e mais notório possível, na busca da sensação de serem ouvidas, pelas outras que faziam exactamente o mesmo.
    Não conheço este livro de CL. Aliás são poucos os livros que conheço, até dos que já li.
    O melhor nem é o de que mais gostamos, nem aquele que devassámos até às entranhas do livro, e nossas, sentindo-o como se fossemos nós a escrevê-lo de nós.
    Como com as pessoas, das quais nem é a que mais gostamos, a melhor, nem a que melhor percebemos, ou na qual nos revemos.
    Afinal, ler é descobrirmos-nos partilhados no que alguém escreveu sem nos conhecer nem falar de nós.
    Se abandonarmos os mais, aceitamos melhor e com mais generosidade, nós simples.
    Mas a gente complica ! :D
    Bom domingo, Olvido. Gostei do mote mas fiquei a suar.

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    1. :)) é verdade, a gente complica. Mas eu gosto de perceber, de chegar ao fim e distinguir o fio condutor que levou ali, e a conclusão. Gosto dos livros que me fazem parar, fechar o livro e pensar, gosto, porque me falam e levam até mim ou até quem quero entender, e este livro tem alguns trechos desses, que fazem parar para pensar, e são extraordinários. Outros fazem-me parar para pensar que não percebi pevide... e no fim não consegui fazer o balanço do livro, a sua conclusão, no fundo.
      Realmente, Nome sem direito, falou aí em algo que concordo em absoluto, as pessoas geralmente gostam de quem não entendem (talvez porque assim têm de ser uma conquista permanente por um lado, e são várias vezes surpreendidas por outro, ainda que nem sempre pela positiva) gostam de pessoas que podem não ser as melhores, mas gostam. Só que realmente nas pessoas a melhor razão para se gostar é não ter razão nenhuma, é não saber sequer porquê... nos livros eu não sou assim, quando leio o último parágrafo tenho saber por que gostei do livro, ou não. E para a leitura deste fui com expectativas que não se cumpriram... “A aprendizagem ou o livro dos Prazeres” que li da Clarice adorei... este desiludiu-me.
      Bom domingo, Nome sem direito :)

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    2. :)
      Gosto do despojo, "Extraordinário" / "Não percebi pevide ... ".
      E, gostar, entender, e, mais algo, nem são sinónimos nem antónimos. Só coisas diferentes e por isso diferentes se bem que que relacionadas.
      Gosto de escrita crua também, que passo e cozinho eu.
      Boa semana, Olvido. :)

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    3. :)) quando não percebemos, mais vale dizer que não se percebe, parece-me melhor que o contrário ;)
      Não é por ser diferente que não gostei, é porque muitas vezes não encontrei o sentido, a mensagem.
      Boa semana, Nome sem direito :)

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    4. Touché ! :D
      Também sou fã desse clube, que, quando não percebe diz, e quando não é percebido acha generoso que lho digam, para que valha a pena conversar.
      Um dia bonito para si, Olvido, e não se chateie desta minha desgarrada. :D

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    5. Vale sempre a pena conversar... então à desgarrada, com espontaneidade é das coisas boas que se pode ter :)) ou eu acho. E quando não se entende tenta-se entender e pedir que expliquem, trocam-se palavras e mede-se o tempo em ideias... eu gosto. Haja com quem ;)
      Um bom dia, também para si, Nome sem direito

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    6. Haja com quem, Olvido. :D
      Que razão lhe dou.

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    7. ;))
      ... e há dias em que se sente uma falta danada, de ter companhia para as ideias e para as palavras.

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