quinta-feira, 31 de dezembro de 2020


A todos os que aqui passam espero que o 2021 seja um bom ano, que o vivam melhor e o saboreiem mais, com mais intensidade e vontade, depois de tudo o que devíamos ter aprendido neste que hoje se enterra, sem saudade ( e no entanto, talvez aquele que mais nos poderia ter ensinado, curioso, não?)

Hoje é o dia de começar a dizer que a partir de amanhã seremos diferentes, que vamos querer coisas, ter objectivos e mudarmos em nome deles ou do que raio nos lembrarmos. Neste ano, além de tudo isso, é o dia de acreditarmos que tudo vai mudar para melhor, que todos vamos ficar bem - agora sim (e a ver vamos), e não quando por estupidez de um optimismo sem quê (que me irrita até à raiz dos cabelos), ao início tantos diziam... e eu nunca percebi. Não tenho facilidade em entender querer-se deturpar a realidade porque não gostamos dela... negar o óbvio (que sabemos mas negamos), para ter uma ideia que aconchegue. Nunca entendi. 
Hoje, mais do que se calhar em todos os outro anos, vamos querer encerrar este ano e enterrar com ele tudo o que vivemos sob esta chancela, quase como esquecer que existiu. Para mim é talvez a primeira vez que não tenho vontade de um novo ano. Não porque goste deste, não, mas porque tenho muito pouca esperança no seguinte, no que se avizinha. E isso para mim é novidade. Sempre tive uma certa superstição com a passagem de ano, sempre quis passá-la bem, com quem gosto e com alegria, risos e brincadeiras, e rodeada de carinho, porque seria assim que gostaria que o ano se desenrolasse - como um prelúdio do que viria. Este ano a sensação que tenho é que o próximo será muito duro em termos pessoais, adivinho um tempo que não quero e que não sei viver. Este ano, o dividirem o tempo em fatias para dar um cheiro de recomeço, de começar de novo, de oportunidade, não me entusiasma, não o consigo ver assim, não o sinto assim. A única coisa que hoje em dia me entusiasma um pouco é o trabalho, também a única coisa que neste ano que hoje termina, se aproveitou em termos de mudanças. Há dias li uma entrevista em que se dizia que o cérebro percepciona o tempo através das mudanças a um certo nível e através do movimento, noutro - o que me fez completo sentido, no fundo, é sempre através da mudança: movimento é mudança, já o disse aqui uma vez qualquer. Mas isto fez-me pensar que nos últimos 10 anos todas as mudanças que o meu cérebro percebeu, portanto todo o tempo que sentiu passar, foi para me tirar afectos, companhia, carinho, protecção, segurança, querer-bem. Primeiro, e a abrir as hostilidades, um divórcio que me feriu em todo o processo (mas continuar casada sei-o, sem dúvida, ter-me-ia feito pior), depois perdi o meu tio ao fim de tanto sofrimento, depois um primo, depois um irmão, no meio uma doença grave e incurável para o meu pai, a lucidez e presença inteira da minha mãe com a perda do meu irmão. Entretanto vender a empresa, entrar num turbilhão de medos e emoções, e sei lá mais o quê, com todas essas mudanças. E no meio de tudo isto, abrir os olhos em muita coisa, fazer opções e cortes com enganos e mentiras, render-me ao desamor, aceitá-lo, vê-lo, perceber que passei por tudo sozinha e servida com pequenos requintes de malvadez em coisas que não merecia, algumas apelidadas de condescendências - palavra que passei a detestar - outras só indiferenças ou faltas de consideração, de justiça até e lealdade também... amor nenhum, torna-se óbvio quando todas as mudanças que colecciono nestes dez anos são estas. Quando o que percebo de tudo é isto. E caramba custou-me tanto, em cima de tudo, também isso, olhar para trás e começar a ver que o refúgio, o abrigo que eu tinha era apenas uma espécie de escape para o outro, que lhe equilibrou o mundo durante muito tempo, que o ajudou até a mantê-lo, enquanto para mim era o meu mundo, onde estava inteira - ou me sentia -, que me permitia suportar o mundo que não era meu, que não queria, tudo o que acontecia sem eu pedir, e o que eu queria que acontecesse, nunca acontecia. Há uma luz, uma doçura, que não posso esquecer no meio de tudo isto, a minha pequenitates, que foi crescendo, e foi crescendo bem, mesmo tantas vezes - ou quase sempre, infelizmente - não me ter inteira, e nunca completamente bem, feliz, com esperança... mas foi crescendo e foi-se tornando uma pessoa (que me dá cabo da cabeça, é certo) que às vezes me surpreende. Não sei o que fiz bem no meio disto tudo, ou se não fiz nada bem e ela deu a volta a tudo isso (capaz disso é ela), mas é saudável em todos os aspectos que me lembro, por dentro e por fora (tem um bocado a mania das dietas, do exercício e da comida saudável e essas coisas... mas pronto, até faz o jantar às vezes, por isso compensa :) ), um bocado arisca de beijos e abraços e mimo, por vezes muito diferente de mim, outras caramba até irrita de ser tão parecida (o que me deixa apreensiva..), e agora quase da minha altura... 
... o que levo de tudo, para onde for, é isto que senti quando bati os olhos na foto, um molho de flores apanhadas no momento, plenas de vida na espontaneidade da vontade, que guardo no bolso de trás das calças, enquanto continuo o caminho, à procura de mais cores, mais flores que me dêem vontade de apanhar e levar, que façam parte do resto do caminho. 
Não estou com vontade nenhuma de 2021, mas isso - aliás como todas as mudanças nos meus últimos dez anos - não impede nada, ele virá na mesma, e as mudanças também, porque o tempo passa e a vida move-se, altera-se, muda sobre um eixo que somos nós, e que tem de suportar todas as mudanças, algumas provocá-las, mas vivê-las todas. E é disso, sim, é disso que tenho medo. Mas talvez isso não seja diferente, tenho tantos medos há tanto tempo que talvez já não o conte em anos, mas em vidas. Guardo-os no bolso de trás das calças de ganga, aconchego-os às margaridas ou bem-me-queres, às papoilas que não arranco do chão porque não são de levar para casa, e continuo. Os cães gostam da caminhada.



 

4 comentários:

  1. E com tantas palavras tuas deixaste-me sem.saberno que acrescentar. Palavras com tanta história dentro, com dor e sorrisos.
    Eu não gosto de mudanças apesar de elas acontecerem, independentemente do que eu queira ou não.
    Venha esse 2021, e que te seja doce, da mesma forma que o desejaste para mim
    Um beijo Olvido

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    1. Sem me dar conta fui escrevendo e escrevendo, no fim percebi que foi o balanço de uma década o que acabei por fazer... e que ficou demasiado comprido também :) mas não mudei nada, para reler no futuro, como hoje acabei por fazer em relação a outros anos.
      Desejo-te sinceramente o que comentei no teu blog, acho que para certas almas é o melhor que se pode desejar ;)
      Beijo para ti

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  2. Olvido,
    que o ano 2021 seja generoso contigo e com os teus.
    Um beijo embrulhado em laços de Esperança :)

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    1. Obrigada, Perséfone :)
      Que o próximo ano te seja pleno e doce de afectos.
      Deixo-te um beijo, outro e o mesmo, menina Perséfone

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