sábado, 19 de dezembro de 2020

 

enrolei as minhas pernas nas dele, ainda de olhos fechados e com um sorriso a acordar-me no corpo. Enrolo as pernas para que não me fuja e para o saber ali, depois da noite inteira, para dias inteiros. abro os olhos e pergunta-me então, estou muito velho? o cabelo já quase branco e muito curto, a barba curta e com o mesmo tempo, e os olhos a olharem para mim, iguais por dentro, ou eu não sabia de diferença nenhuma. abracei-lhe o rosto com as mãos e dei-lhe um beijo. estava na mesma, o beijo não mudou, era um beijo sem tempo. e dei um e outro e mais outro até já não contar tempo, mas risos e pele e calor. afasto-me um pouco para voltar a olhar-lhe os olhos entre as minhas mãos e mergulhar-lhe no olhar, e percebo que não sei o que vê, se vê o mesmo que eu vejo, ou que eu não vejo quando o olho... penso o que verá? e é isso que me acorda: a minha idade nos seus olhos, sou eu que estou velha. escrevi algures, ou pensei, - às vezes não sei da diferença -  que o amor é o único antídoto da idade. Não cura, mas não deixa que nos seja uma doença. talvez só como alguns os amores, não parecem sofrer de tempo ou espaço, sobrevivem desde que se respire. e às vezes sonham-nos, invadem-nos a mente enquanto dormimos, indefesos, de muros baixados e  sem tino no que (nos) faz a cabeça. acordei. não havia pernas onde enrolar as minhas. desenrolo palavras sobre mim mesma para não enrolar o dia, para libertar as pernas para o caminho. o meu caminho.

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