A raridade poucas vezes sobrevive, está condenada, por esmagamento ou exaustão. Por desilusão também. Gostava de encontrar pessoas assim, que se dêem, que dêem tudo o que têm, que tenham palavra. talvez até andem por aí e não damos por isso, fazem pouco alarde os genuínos, se calhar. Talvez. Camuflagem também é defesa. Desistência também é sobrevivência.
sábado, 30 de novembro de 2019
terça-feira, 26 de novembro de 2019
domingo, 24 de novembro de 2019
Dispensando o açúcar,
será que ainda vale o convite para café?
Ou para isso é preciso usar açúcar?
É que então não vale nada...
[tenho ouvido ultimamente que devia ser mais doce ao falar...
ando a agitar demasiado as águas... deve ser falta de açúcar.
Que eu quero manter.
A minha doçura, se a tiver, é espontânea,
e realmente nunca foi para todos... menos ainda por encomenda.
É uma doçura sem agenda, ou objectivos. Ou convites, lamento. ]
O fim do dia, da noite, o silêncio das luzes apagadas, as janelas acesas: os olhos postos no de fora olhado por dentro. O tríptico de luzes e sombras na parede, uma campânula sonolenta debruçada sobre o sofá. E eu aqui sentada, a pé ainda, sem saber das horas ou horários. Olho o dia e fecho páginas. Mas há sempre páginas em branco, que esperam o que hão-de ser. E eu já toda escrita à procura de páginas onde ainda possa escrever, ser, viver. Espero palavras de cores que ainda não conheça. Parece que a vida se esquece de acontecer nos intervalos dos dias corridos.
Penso em quem continua do lado de fora, pergunto-me se precisam do silêncio das luzes apagadas, assim, para fechar o dia, e a noite, se lhes faltarão tantas cores como a mim, se os silêncios, e precisar deles, vem do que se viveu ou daquilo que se é, como se é.
O silêncio será como uma ausência? É algo que nos trazem pela falta, ou é só uma presença em nós, um bocado nosso que trazemos connosco?
Penso em quem continua do lado de fora, pergunto-me se precisam do silêncio das luzes apagadas, assim, para fechar o dia, e a noite, se lhes faltarão tantas cores como a mim, se os silêncios, e precisar deles, vem do que se viveu ou daquilo que se é, como se é.
O silêncio será como uma ausência? É algo que nos trazem pela falta, ou é só uma presença em nós, um bocado nosso que trazemos connosco?
sábado, 23 de novembro de 2019
[foto @projetoamoramora]
TRAPÉZIO
subir por aquele rapaz acima
e chamar deus à vontade
de subir
Raquel Nobre Guerra
[deus...
que vontade,
o rapaz, aquele,
aquele só.
a bíblia da pele
que leva a alma ao céu.
céus.
aquele só.
a bíblia da pele
que leva a alma ao céu.
céus.
a subida ofegante
a descida em suspiro
a vontade, a vontade,
a vontade, tão à vontade
tudo. sempre.
deus!
deixa-me cair.]
sexta-feira, 22 de novembro de 2019
segunda-feira, 18 de novembro de 2019
Há pessoas com a capacidade de partir o mundo dos outros. Reduzi-lo a cacos. E não quer isto dizer que a imagem do mundo fosse muito boa, mas era inteira, sentia-se-lhe um sentido. Agora, quando se tenta pegar, caco a caco, para refazer algo, tudo sao arestas que nos cortam as mãos. Que sangram o sangue que tínhamos quando as coisas pareciam ter algum sentido. Esvaímo-nos agora do que fomos. Não há como voltar a colar o mundo, a vida. Talvez não devamos refazer nada, talvez o que se parte seja para ficar partido, talvez haja nisso um novo sentido, e nesse, os cacos dispersos fazem um mundo, que iremos entender, que não se voltará a partir. E talvez o todo valha mais depois de partido se soubermos como tratar cada parte, cada coisa - o lugar de cada coisa. O nosso lugar, as coisas sem lugar e o lugar daqueles que partem o mundo dos outros e ficam com as mãos intactas. Não sangram, e seguem a partir novos mundos, daqueles que ainda têm inocência suficiente para se deixarem partir. Coitados.
domingo, 17 de novembro de 2019
sábado, 16 de novembro de 2019
Não tem receita, mas alegam que se vende sob prescrição médica... não pode.
Publicidade enganosa. Não se vende, por muito prescrito que seja. Ou necessário, ou necessitado. Acontece quando se tem, ou teve, prescrever, isso sim, acontece.
É genérico, sim, mas nunca se sabe onde se pode arranjar, é demasiado específico para cada um. Os efeitos secundários, quando se começa o tratamento, esses,
são óptimos e generalizados: estupidez da mais pura e nuvens por chão. Com o tempo tendem a desaparecer, fica apenas uma sensação de bem estar, connosco e com a vida, que ajuda a enfrentar o mundo.
são óptimos e generalizados: estupidez da mais pura e nuvens por chão. Com o tempo tendem a desaparecer, fica apenas uma sensação de bem estar, connosco e com a vida, que ajuda a enfrentar o mundo.
Há quem o tome apenas por via oral, muitas vezes assim tomado revela-se um placebo de descoberta retardatária e de efeitos por demais nefastos. Há mais no amor que a via oral, raramente eficaz nos princípios activos, e do verdadeiro não há maneira de se poder abusar, não se conhecem medidas para o bicho, nem morte por overdose.
Resumindo: publicidade enganosa é o que é.
O amor não é um produto senão do acaso, e não se compra, e não há amor em comprimidos, injectável ou enfrascado (embora haja relatos de quem o pensa ter encontrado, depois de enfrascado...) ou o que for, são tudo placebos. E saem caros.
Cobram-se em tempo e sonhos.
;)) Bom dia!
quinta-feira, 14 de novembro de 2019
Há pessoas que nos vão ganhando aos poucos, sem darmos por isso vão passando a fazer parte do nosso dia, entram descalços como quem respeita o chão da casa que quer conhecer. Vão-se tornando casa e fazendo casa, devagar, com a consciência que cada lugar tem um tempo, mas que tudo pode ser conquistado, ou, pelo menos, acolhido. Há frases que vão ficando, sentidos que nos vão acalentando, ao ponto de se sentir a falta quando o silêncio se torna ausência. Chegamos ao ponto de desejar a presença, sem que disso haja consciência, até que há, e tentamos perceber o que aconteceu, ou porquê, e não há resposta mas há um sorriso que nalguns dias persiste. E medo, não se sabe de quê, como não sabemos explicar porque nos ausentamos do tempo quando repetem frases de outros tempos. Sem o saber, repetem frases antigas que nunca conheceram, que usavam outra voz. Gostam do olhar onde descobrem meiguice... e gostam da minha cabeça, e eu gostava de apagá-la em muitos momentos, partes dela, pelo menos. Gostam dos movimentos, do andar, das expressões que não noto serem minhas... sem saberem o que ouvi-lo move consigo. E face a um ou outro atrevimento catita, com piada, que me faz rir, eu lembro-me do que não quero responder, que já respondi, e no compasso, calo-me. Não quero repetições.
Lembram-me para olhar a lua, e eu quero esquecer que vi. E não sei mais nada, de perdida no tempo em que as palavras me diziam coisas que nunca disseram.
um homem não chora a não ser
quando geme
nos braços de quem
o prendeu pela boca
Bénédict Houart
Gemidos de corpo inteiro, a carne quente cravada de suspiros, arrepios que eriçam a espinha, bocas que dão de beber, que prendem a vontade de pele à pele de alguém. Pele que não aprisiona a alma, pele por onde nos libertamos, onde deixamos o mundo sem deixarmos de nos ser. Braços onde somos livres e abraçamos a própria essência que entregamos, onde somos livremente, numa intimidade que geme de vida que escorre para dentro.
É a vida que nos prende num gemido, se tivermos sorte.
quarta-feira, 13 de novembro de 2019
Desligo as luzes como quem foi dormir, fecho a luz do dia em mim. Mando a bicha para a cama, ela vai e volta passado quase nada, enrola-se nas sombras do chão. Acendo um cigarro no cadeirão com vista para a chuva, os pés dentro das pantufas contra o vidro, e os olhos de mim para dentro. Olho como quem dorme, inconsciente de mim, consciente em sonhos. Oiço o batuque da chuva lá fora. Há coisas que não mudam. Quantas vezes já fumei este cigarro, aqui, assim?
Dou-me conta que continuo a perguntar-me tudo e nada, coisas demais sempre, e que cada vez mais quero que me dêem menos respostas. As nossas perguntas definem-nos e as respostas a que chegarmos também. Talvez haja, para cada um, uma resposta. Por isso não quero respostas de ninguém, ou cada vez menos. Quero as minhas perguntas até às minhas respostas, ou, talvez, aceitar apenas perguntar-me. E ir conversando com a chuva, falando-me no silêncio das palavras. E ir fumando os mesmos cigarros, nas noites que são as mesmas do que nunca foram. O tempo só existe se olharmos para trás.
terça-feira, 12 de novembro de 2019
segunda-feira, 11 de novembro de 2019
domingo, 10 de novembro de 2019
...espírito de Domingo melancólico...
...dos fins de semana de Outono que valem quanto vale o prazer da nossa companhia,
dos pensamentos que nos agarram enquanto vagueiam pelas frases que lemos,
e da música que nos envolve neste compasso lânguido e lento,
acolhendo este cinzento que entra pela janela como um aconchego.
["O escritor galardoado (...). Nota-se-lhe um certo incómodo, uma certa aspereza. Talvez poucos dos presentes o tenham lido. E, mesmo que tivesse sido muito lido, na realidade de pouco lhe pode servir, pois ninguém o ama, e desse ponto de vista é como se ninguém o tivesse lido. Não há amor aqui, não há amor em lado nenhum. E talvez ele saiba e aceite isso. Todos sabemos e aceitamos, pois a literatura é já algo irrelevante na medida em que não há nela amor. Não há nela amor, pensa o homem de gravata amarela, e devia haver, pois só o amor tem sentido, e onde estará o seu amor, e o que está a fazer neste sítio se não encontrar aqui amor, e lembra-se do seu pai então, cuja vida aconteceu segundo esta ordem que aquela mulher com tacões severos simboliza.
O seu pai teria ficado contente ao vê-lo ali, junto dos reis. Teria gostado que ele lhe contasse alguma anedota, talvez por isso tenha ido, por amor ao pai."
Manuel Vilas, in Em tudo havia beleza [Ordesa]
Quando se sabe amar leva-se amor a todo lado, connosco, em gestos que os corações alheios não vêem. São gestos fruto de fazer o que se sente, só. Apenas quando se questionam, quando olham para dentro dos próprios gestos que vivem, vêem. Vêem onde os outros nem olham. Há corações que raramente se questionam, que não vêem para dentro e nem sequer olham para fora, que nunca chegam a ver ninguém, apenas batem e nem sabem por quê.
Para quem sabe amar há amor em tudo, tal como há beleza em tudo. Beleza é amor.]
sábado, 9 de novembro de 2019
É preciso um abraço, daqueles que param a rotação da terra, que suspendem tudo, que largam o dia lá fora, que aconchegam a respiração do coração.
Há dias acordei a meio da noite, mais uma vez com os bebés patudos a fazer barulho, levantei-me e fui ver deles como quase todos os dias de há duas semanas para cá, acabei a fazer um biberon e a dar ao mais magricela, com medo que a magreza o consumisse. Voltei para a cama, e só me lembro disso: de precisar dum abraço que me parasse o tempo, me retirasse do mundo, me fizesse descansar do carrossel louco que têm sido os meus dias. Embrulhei-me em mim mesma, fiz dos meus próprios braços o abraço, e debaixo das mantas senti frio, só o cansaço o adormeceu, deixando-me abraçar o sono durante umas horas.
Lembrei-me agora disso, agora que me sento no sofá e o fim do dia me abraça de anoitecer pela janela.
Lembrei-me agora disso, agora que me sento no sofá e o fim do dia me abraça de anoitecer pela janela.
quinta-feira, 7 de novembro de 2019
terça-feira, 5 de novembro de 2019
domingo, 3 de novembro de 2019
[Manuel Vilas, um Em tudo havia beleza (Ordesa)]
Que frase para abrir as hostilidades... faz-nos logo parar.
O que tem medida é mais real, mais fácil de lidar, de contar de remediar. De conhecer por fora e até comparar. De pôr por ordem, ou em ordem. O que não tem medida, o que não se desfaz em números e se perde em palavras que nos ganham, é irredutível. É de cada um.
É abstracto, e no entanto nada é mais real no nosso por dentro de ser.
... este dia-bónus está-me a saber melhor que ginjas!!
E há uns relances de sol e tudo :)
Só faltam as macacadas e parvoíces, entre um biberon e outro, uma limpeza e outra...
um virar de página ou outro e o olhar lento para fora da janela,
como uma brisa de que a pele ainda foge, aninhada em si mesma.
Bom Domingo, crianças :)
sábado, 2 de novembro de 2019
sexta-feira, 1 de novembro de 2019
Era aquele que eu achava mais bonito. Vi-o nascer, ainda sujo e acinzentado. Notava-se já que a pelagem seria ruão, ficou com o nome de Malhadinhas por causa disso. Os outros ainda pareciam branquinhos como pelagem de fundo. Todos foram baptizados logo com o nascimento ou no dia seguinte quando de quatro passaram a nove, e depois - já depois de eu sair de casa a correr com 3 horas de sono e meia de atraso para chegar a Viseu na hora marcada -, para dez. Esse, o último, o lento, o pachorrento ficou Alentejano, o primeiro, todo taralhoco com este mundo todo novo, ficou Tobias, a Flash saiu disparada e assim ficou, num flash. Aquele que trazia um coração em mancha no dorso ficou Romeu... todos ficaram com identidade, e reconhecemo-los todos. O Malhadinhas tinha uma grande mancha no ombro direito, e começou, a não crescer como os outros, mesmo com paciência acrescida e biberon, ele dormia quando os outros se esgadanhavam para mamar, uns mais outros menos. Ontem ao dar-lhe o biberon da noite senti uma paz... uma coisa que não consigo explicar. Hoje de manhã confirmei, explicou-se.
A Pintarolas agora é mãe de nove, mas, como todas as mães que passam por isto, continua a ter dez filhos.
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