[foto de Flavio Franja, via @33thirdmedia]
Pego no último cigarro do dia para fumar, penso em fechar o portátil, não me apetece escrever, mas não fecho, venho para aqui. Não sei porquê, porque não me apetece escrever, mas talvez o ecrã branco me faça companhia numa conversa que não existe, mas de que às vezes preciso. Para dizer o quê? Não sei. Normalmente as letras vão-me guiando e caindo, sem eu dar conta, nos sítios que me faltam, como se soubessem o seu caminho e o meu dizer. Que quererei eu dizer? que tenho a miúda a dormir tranquilamente no sofá ao meu lado porque adormeceu há horas e resolvi esperar até eu mesma ir e fechar tudo? Que tenho aos pés um dos cães porque a outra - com a mania das independências que lhe assiste - já foi dormir para os seus aposentos quando a hora dela lhe chegou ao pêlo? Não sei, não sei o que quero, ou preciso, dizer. Fico por aqui, com as letras a dançarem-me nos dedos à musica dos meus pensamentos, como se, abraçada ao meu próprio corpo inteiro, me aninhasse num canto e me deixasse ficar, sozinha, a ouvir duas respirações que dormem e onde não me apetecem invasões, estranhos. Onde só deixo entrar esta solidão que se sente não sendo sentida, numa estranha mistura do que é e não é. Do que quero e não quero. Como um não que é um sim, e um sim que arrasta um não. Um meio caminho sem caminho, por onde me passeio alegremente numa tristeza ainda por entristecer, sem norte, como se não o precisasse. Estranha sensação esta, de tristeza por entristecer. Mas é essa a sensação, que não chega a ser triste, pelo contrário.
Não é a frieza da solidão que me invade, porque não é vazio que sinto, nem é a noite, dentro do dia que já foi, que me impele, é só esta vontade não sei de quê, não sei de quem, não sei porquê. Talvez dum sentido que me assente e oriente, que eu navegue ou me navegue a mim, nem sei. É suposto nesta vida seguir-se um caminho ou é o caminho da vida que nos (per)segue? Será que a vida também vai encontrando, sem eu dar disso conta, o sítio onde cair? Como as palavras? Mas não onde me faltam, ou estas palavras não caíram aqui, provavelmente. E uma conversa existiria, mesmo que não fosse precisa.