sábado, 15 de maio de 2021

 
Noto que me afasto de mim quando falo, e sinto, as coisas de que realmente gosto como que de amores antigos, distantes e arrefecidos. Pouco meus, como coisas que (nos) foram. Também aí o amor paixão está distante, acamado e consumido pelo tempo costurado dia a dia, dia após dia, desilusão ferida de desilusão. Ontem, ao fim do dia, cheguei a casa com dois livros novos. O primeiro, que foi “plantado” na minha secretária de trabalho logo pela manhã (o que me fez arrumá-lo discretamente e ficar muito sem jeito), pega nesta ideia que os livros são um refúgio e um gosto, talvez uma mania. Não lhe chamaria vício porque não lhe encontro contra-indicações. Talvez eu fale muito de livros, ou do que me fica deles (mesmo com a minha memória de galinha para citações fidedignas). O outro estava guardado desde os meus anos, e foi-me entregue ontem no primeiro jantar depois de sei lá quantos jantares perdidos para os tempos virulentos. Um jantar de risos à distância segura de matar distâncias outras, de petiscar a mesa e abraçar com os olhos à despedida, como à entrada tarde e a más horas depois de hora e meia de viagem. O terceiro - A louca da casa - é o livro que comecei, e que já não pego talvez há umas duas semanas, ou mais, não sei. E gostei do que já li, ainda que haja naquele livro demasiados pensamentos e sensações que me são familiares, em que ao mesmo tempo que acho piada a isso, não me faz questionar ou parar para pensar, pelo menos até agora. Diz coisas que já pensei ou senti, nesta coisa do escrever. Do sentir as palavras, ou o que raio é isto que nos leva a despejar-nos em símbolos descodificáveis. As frases com que se acorda, ou que surgem dalgum recanto nosso que não conhecemos ou reconhecemos, em qualquer altura e sem aviso, de sonhos a semáforos vermelhos, e que não nos largam até as escrevermos. Até dissolvermos o feitiço em palavras que nascem e crescem dessa semente. Dessa pequena loucura em que mergulhamos, como um submundo instantâneo da normalidade. Mas teve o efeito curioso de perceber que é coisa que afinal acontece a muita gente, sou menos louca do que me pensava, ou a casa que nos alberga é bastante maior que julgava. Afinal loucos assim há muitos. Dos outros também.

[por incrível que possa parecer, estão 3 canídeos não foto. As patas de um, parte da cabeça da caçula e um tiquinho, quase imperceptível, das pintarolas da mãe... tudo na preguiça ainda ]

Sem comentários:

Enviar um comentário