sábado, 7 de novembro de 2020

[foto @manoleili]

De luas, desatino e aguaceiro

Todas as noites que não foram tuas.
Amigos e meninos de ternura

Intocado meu rosto-pensamento
Intocado meu corpo e tão mais triste
Sempre à procura do teu corpo exato.

Livra-me de ti. Que eu reconstrua
Meus pequenos amores. A ciência
De me deixar amar

Sem amargura. E que me deem

A enorme incoerência

De desamar, amando. E te lembrando

– Fazedor de desgosto –
Que eu te esqueça.

Hilda Hilst

Incoerência essa, de desamar, amando, e sem amargura, com o tempo a apagar as dúvidas e a acomodar certezas incómodas, difíceis, doridas. Mas sem amargura, com o travo de acidez que deixam na boca todos os beijos que não se deram no abismo apodrecido dos que se deram imerecidos, feridos de engano original, amando no desamor de outros. E agora é só continuar, só mais do mesmo, mas no seu inverso. Espelhos que a vida traz, um atrás do outro, sem partir.

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