sábado, 16 de dezembro de 2017

[foto @lunaa80]

"Bom dia, amor"
Lembrava-se bem da manhã que acordou para aquela mensagem, e de como, logo,  o dia deixou de existir, como o mundo desapareceu, sugado por aquelas parcas letras. Há momentos de felicidade de uma tal violência, por coisas de quase nada, que têm o dom de dizimar tudo ao seu redor, de suspender o tempo, de apagar o resto, e na altura tudo é resto, só se respira o essencial, o que se sente de dentro abarcar tudo por fora. Ela sabia que naquele quarto de hotel, sozinha, ninguém a via, mas estava certa que se a tivessem visto, naquele preciso momento, os outros a achariam outra, tal a luz que parecia inconter, o sorriso de plenitude que lhe tomava as feições, a pele, o olhar.  Daqueles raros momentos em que a pele é alma, o de fora é o de dentro, em que não nos conseguimos esconder, somos inteiros por distracção, por surpresa, por sermos tomados, açambarcados pelo momento. Aquele, que depois parece não ter existido, quando as rodas do mundo, de repente, voltam a acordar e a girar o quotidiano. O que fica a memória guarda, e brinca connosco.
Ela mandou a mesma mensagem. Percebeu que há mundos que não param à nossa passagem, às nossas palavras, a nós. Que as coisas se sentem de modo tão diferente, ou não se sentem sequer, talvez. Que há almas que não carregam a plenitude inexistente de sorrisos que ficam por acontecer. A resposta vem de longe, duma distância que, como uma vez lhe havia dito, não se mede em quilómetros mas em saudades. Quando há saudades a distância é sempre demais, quando não há, a proximidade esqueceu-se de ser perto.
Há momentos em que percebemos o inacreditável e extraordinário - e ridículo, tão tremendamente ridículo - que é, para algumas pessoas, um momento de quase nada ser um tudo que se prolonga para quase sempre. Sim, um dia será quase sempre, a substituir o sempre do enquanto.

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