domingo, 28 de junho de 2020

[imagem @diego_cusano]


Há que manter a cabeça fria, talvez seja verdade,
tudo o que deve chegar, chega a seu tempo... 
não que seja muito adepta - porque não sou, não sou nada mesmo, chamam-me pessimista por isso, e estão sempre a repetir-me que energia positiva atrai energia positiva... coisa que não sei em que física aprenderam, mas sou eu que sou esquisita, já sei... - dessas cómodas ideias de que tudo no fim correrá bem, mas... hoje, por exemplo, parece que o verão finalmente chegou...
Só não se sabe se para ficar, mas isso também nunca se sabe, quem chega para ficar. 
Normalmente vai ficando, o tempo vai-se derretendo nos dias, o resto depois vê-se.
Se for doce é de manter, senão é manter a cabeça fria... e o coração quente. 
(alguém me dizia no outro dia que o segredo era manter a cama quente, mas ainda sou uma romântica, parece... ainda que pessimista aos olhos dos outros, o que poderá até estar correlacionado, penso agora...)

Bom dia!

sábado, 27 de junho de 2020

Arrancar da pele a vida, e deixá-la debaixo das unhas
a esgravatar os dias da vida que há-de acontecer... 
... e a escrever, ainda e às vezes, para saber que ainda tenho unhas, 
para sentir que não morri.

quinta-feira, 25 de junho de 2020



Estranha esta sensação do nunca estar cada vez mais perto, mais presente, mais adentro, que me pára os pés já a caminho. Tão pouco ainda para trás, e tanto que falta para chegar ao nunca, para o ser. Ainda que já cá esteja, já seja. Como o infinito num espelho fechado no próprio reflexo infinitamente, até nunca mais, sempre. 
O nunca como sentença perene e consciente sempre me assustou. Como uma amputação, uma mudança irrevogável e irrecuperável, que pesa toda a (nossa) eternidade num vazio que tem tudo... que esperamos venha a ter tudo.

segunda-feira, 22 de junho de 2020

... estou esquisita pelo avesso. Não sei porquê... e não encontro outra forma de tentar explicar a coisa senão dizer, como há pouco escrevi a alguém, que parece que estou com bichos carpinteiros na alma...
... sabem aquela sensação que algo nos ferve por dentro e não sabemos porquê, ou de quê? É como estou, como se estivesse prestes a fazer um grande disparate, trepar esta loucura que me sobe por dentro das mãos, dos olhos, da boca, de cada fio de cabelo. E o pior é que nem sei fazendo o quê, ou como... é só uma inquietação sem nome, sem causa, mas cheia de vontade de qualquer coisa que ainda não descobri, que ainda não se descobriu a si mesma... sim, é verdade, já fui mais certa das ideias. É verdade, mas é o que temos agora... alguém sabe como tratar da saúde aos bichos carpinteiros na alma?

domingo, 21 de junho de 2020

...right!!!
...then left...
E pronto quem tem de acartar a lenha sozinha  sou eu... que foi o que estive a fazer nas últimas 3 horas da minha vida. Coisa feminina e sexy hein??? Acartar lenha duma divisão para a outra em nome das malditas obras que parece que nunca têm fim... e agora tomar um banho e a seguir pôr um vestido de verão, leve e quase esvoaçante ou qualquer coisa assim :)),  e passear as minhas meninas... temos de equilibrar a coisa... right?

sábado, 20 de junho de 2020

[foto @nihan.tezer]

Há qualquer coisa de ternurento na beleza dum campo de papoilas. Sempre tive uma coisa por papoilas, já aqui escrevi (ou então foi noutro sítio, já não sei). Lembra-me a infância em que ainda tinha o meu avô, e que no canteiro do prédio da casa dele, agora minha, havia muitas papoilas. À desgarrada, sem pedido ou licença, como todas as melhores coisas. E eu gostava, e fiquei sempre a gostar. Talvez por isso imagens de campos pintados de papoilas me dêem alguma sensação de tranquilidade, de paz doce. Daquilo que hoje, quando me levantei, me apeteceu vestir a alma, demasiado nua há tempo demais. Demasiado muda há luas demais. Será que a alma, se não a usarmos para o que realmente serve, também caduca? Estraga-se? Desaprende? Esquece? Olvido para a alma também pode ser bom, às vezes o melhor... Ontem à noite dei por mim a pensar - até por tudo que temos passado nos últimos meses - que a privação cura-nos de muitas vontades. E que a privação, desde sempre, de amor, cura toda a vontade de amar, por desconhecimento, por medo, por tão longe estar da zona de (des)conforto em que crescemos e a vida ensinou alguns a viver.  A grande fatalidade é tropeçar nele, e depois fugir-lhe e a toda a vontade, mas tê-la, como uma segunda pele, uma de que temos consciência tempo demais, porque grita no silêncio do ruído dos dias. Ou como uma memória afundada no tempo que às vezes acorda connosco, acorda-nos, com uma sensação tão presente como um desejo de anos que o tempo não levou, não apagou. Não estragou, guardou incólume. Como a sensação que tenho quando vejo imagens de papoilas, tão frágeis, tão selvagens, tão vivas, tão fortes, tão ternurentas... e tão minhas, da minha infância e do meu avô, perdidos que estão os dois e ainda tão dentro. Talvez a privação nos cure da vontade, nos ensine o que não podemos ter, mas não cura a dor de ter tido.

quarta-feira, 17 de junho de 2020

Oh yeah....
A melhor terapia para todos os tempos e disposições 
Melhor se for ao fim da tarde, com a luz dourada a dançar-nos nos olhos,
a aquecer as deambulações da alma.

domingo, 14 de junho de 2020

Ontem saio do trabalho, para que fui sem vontade diga-se, à pressa para comer qualquer coisa e seguir para o dentista, donde a miúda saiu com a boca a parecer uma trincheira de guerra, mas muito feliz com isso - quando eu pus aparelho não fiquei nada feliz, mas os tempos parece que são outros, e ela é muito diferente de mim... o que sendo uma coisa (muito, e eu sei) boa não há dia que não me faça maldizer o facto. Hoje dormi até mais tarde, coisa boa, mas sem ronha; levantei-me e levei a cadela ao veterinário... andava esquisita, e eu estava a ficar preocupada. Ao que parece está grávida, outra vez, mas desta só na cabeça dela - graças a Deus porque eu não seria capaz de passar outra vez por aquilo tudo, e ela é que teve dez filhos, mas eu é que dei biberon a todos, vezes sem conta, muitas de madrugada, lavei a cozinha dez vezes ao dia, e eu (nós, que não o fiz sozinha) é que enterrei seis deles, e não quero voltar a passar por nada parecido, fiquei exausta em todos os aspectos... então, agora, está com uma gravidez psicológica, e anda triste e ansiosa e esquisita, mas felizmente será só isso, e passa. No caminho pede e tem mais mimo, o que é não é mau. Voltei para casa, peguei no livro, tentei ler, larguei o livro, apanhei sol na varanda,  queimei neuronios na televisão ainda à luz do dia, coisa que já não me lembro de fazer... e nisto tudo, muitas vezes durante o dia dei por mim a perguntar-me que raio ando eu aqui a fazer? Às vezes parece que os dias passam como quem queima fósforos, assim, uns atrás dos outros, sem acender o cigarro que se traz nos dedos, ficando só a olhar para os restos mortais, inertes e queimados do anterior enquanto se risca o próximo. Há dias em que lucidamente vejo o abismo a abeirar-se de mim, quase a envolver-me... e olho para o lado - não paro, só olho para o lado. Alguma coisa terei aprendido com certas criaturas...acho que se o ignorar ele não me vê. E todos sabemos que o perigo não é vermos o abismo, é ele olhar de volta para nós, porque vê-nos. E isso é uma chatice. Sempre que alguém, ou alguma coisa, nos vê realmente, é uma chatice. Nada de bom costuma vir daí. Pelo menos que eu saiba, que eu conheça. E várias vezes durante o dia me perguntei: o que raio andas tu aqui a fazer? E eu, que dizem ter resposta pronta para quase tudo, não sei responder. Não sei. Mas agora, aqui sentada no cadeirão da varanda, abraçada a uma manta amarrotada de tempos e memórias, que me aquece e me lembra do frio, rodeada deste silêncio nocturno, acho que não preciso de saber o que raio ando aqui a fazer, desde que ao menos goste de alguma coisa, alguma coisa faça sentido. Como este cigarro entre os dedos que queima o silêncio da noite que me embala em palavras mudas. E isso faz sentido em mim, pelo menos agora, já.  Mesmo que não tenha sentido nenhum, e a pergunta continue sem resposta.

quarta-feira, 10 de junho de 2020

[Murasaki Shikibu, in O Romance do Genji]

Gostei deste.
Falavam em poemas entre si, em recados que mandavam, cifrados e com referências a elementos naturais. Gosto da ideia das mensagens ocultas, das palavras disfarçadas, das coisas que só o destinatário perceberia. A estrutura era rígida (waka, ou tanka, poemas de 31 sílabas, origem dos haiku, parece) e o remetente era avaliado pela qualidade do poema, tanto na elaboração das alusões como na sensibilidade de expressão. E eram frescos, muito frescos, tinham um grande tráfego na correspondência e imensos destinatários. Assim eram os tempos.... eram?
Um romance de referência, muito recomendado ao que parece (a minha ignorância desconhecia-o), vou a meio e ainda não me encantou. Pelo que li acerca, o melhor, o intrincado nível psicológico do romance virá na parte final. A ver vamos.

terça-feira, 9 de junho de 2020

... há dias em que apetece isto 
em vez de dizer, a certas pessoas, “bom dia”...

domingo, 7 de junho de 2020

[Pablo Neruda]

Há noites em que não faz sentido apagar o dia sem lhe sentirmos a luz. Nestas noites percebo, relembro, por que quase todos os meus livros de cabeceira, que se amontoam ao meu lado debaixo do candeeiro, são de poesia. Há noites em que o dia falta mais, e é talvez nessas que me procuro entre as resmas de folhas poisadas, fechadas, cheias por dentro. Folheio ao acaso, ou persigo marcas antigas, que outras noites deixaram. E é tão bom... gostar do que se encontra... encontrar o que não se espera e  gostar, ou recordar o que se gostou, porque se volta a gostar, outra vez. Como um passado que é agora, porque ainda somos nós. Para as noites vindouras de fome insaciável de qualquer coisa inominável, esta ficará marcada. Como as cinzas, que silenciosamente vão caindo, no trilho para novas maçãs. Marcam o caminho, mostram-nos quem somos... e o que tanto de nós dirá, como o que nos falta?


sexta-feira, 5 de junho de 2020


Nosso amor é impuro 
como impura é a luz e a água
e tudo quanto nasce
e vive além do tempo.

Minhas pernas são água,
as tuas são luz
e dão a volta ao universo
quando se enlaçam
até se tornarem deserto e escuro.
E eu sofro de te abraçar
depois de te abraçar para não sofrer.

E toco-te
para deixares de ter corpo
e o meu corpo nasce
quando se extingue no teu.

E respiro em ti
para me sufocar
e espreito em tua claridade
para me cegar,
meu Sol vertido em Lua,
minha noite alvorecida.

Tu me bebes
e eu me converto na tua sede.
Meus lábios mordem,
meus dentes beijam, 

minha pele te veste
e ficas ainda mais despida.

Pudesse eu ser tu
E em tua saudade ser a minha própria espera.

Mas eu deito-me em teu leito
Quando apenas queria dormir em ti.

E sonho-te
Quando ansiava ser um sonho teu.

E levito, voo de semente,
para em mim mesmo te plantar
menos que flor: simples perfume,
lembrança de pétala sem chão onde tombar.

Teus olhos inundando os meus
e a minha vida, já sem leito,
vai galgando margens
até tudo ser mar.
Esse mar que só há depois do mar.

Mia Couto, in "idades cidades divindades"

[leio e releio e está tudo dito, ficando tanto por dizer. Tudo. Há coisas que por mais que se digam nunca ficam ditas. Tal como amar, quando o amor é impuro assim, de tão real. Come todas as margens, não conhece caminhos traçados, solve-se em todos os mares como um só, que é tudo. E nada.]

quarta-feira, 3 de junho de 2020

Ahahahah...
...sim senhor, isto é que é uma resposta cheia de estilo!!...
[e que pode ser usada nestes tempos em que tantas conversas começam por aquelas frases costumeiras “há tanto tempo que não te vejo...” vou experimentar...]
:)))))

Bom dia!!

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Há dias em que tentas. Há dias em que pensas que o tempo já lavou da alma as marcas e a memória da pele, em que pensas que já esbateu aquela sensação tão viva do comodamente íntimo, para depois descobrirés que cortante é a sensação do intimamente incómodo que sentes a rasgar os momentos.  Essa sensação que a superfície disfarça, mas a alma reconhece num contorcer-se que nos muda a posição do corpo, sem mudar a situação. E quanto mais se procura disfarçar, ou contrariar, ou insistir a cada esforço de naturalidade, só nos sublinha a existência de tudo o que falta - e então parece faltar ainda mais... o que pensávamos que o tempo tinha esmaecido. E então percebe-se que as cópias, boas ou más, são sempre uma lembrança, uma veneração até, do original. Há dias em que mais valia não tentares. Se calhar todos. Curiosamente, já o sabias.