terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Dos dias de balanço, do que se passou num ano, do que nos passou nesse ano, o que vimos, o que não quisemos ver e o que não vimos até não conseguirmos ver outra coisa, não voltarmos a conseguir ver doutra maneira, e tudo ganha outra realidade. Percebemos o que não queremos, o que nunca sequer merecemos, e as cores transmutam-se no nosso olhar pelo lado de dentro. Como quando lemos alguma coisa pela segunda ou terceira, ou décima vez e só dessa vimos nitidamente o que não tínhamos lido no que está escrito, mas sempre esteve lá. Como uma revelação. Às vezes com a vida é o mesmo. Há um momento de revelação, uma epifania. Que podemos negar, e depois até desprezar, ignorar, voltar atrás, repisar a antiga surdez, mas a vida apanha-nos sempre. E então acontece  percebermos que entre as coisas teimosas que vamos contrariando vamos escoando o que de grande a vida pode ter. 
Hoje ligou-me um amigo que me disse que tudo o que eu lhe disse que achava ir acontecer, está a acontecer. E eu tenho pena que assim seja, porque não foram coisas boas as que lhe disse e porque esta minha apontada lucidez nunca me serviu, ou melhor, tendo-a nunca consegui agir segundo o que me fazia ver. O que me exigia. Nunca. Até eu sentir no vermelho quente do sangue o mesmo que a fria lucidez sempre me repetiu. Como ele hoje o dizia, está a passar-se o que da lucidez ele não quis ouvir. Só quando realmente se sente o que se pensa, é que deixamos de contrariar a simples correnteza natural das coisas. Negá-la não faz com que deixemos de ser arrastados, só nos cansamos mais... até querermos ver em vez de negar o que (vendo) não queremos ver, ou acreditar. 
Este ano, bem vistas as vistas, não mudou nada a não ser o meu olhar sobre tanta coisa que se passou tanto antes. Como se de repente o coração tenha compassado com a razão. E isso, não parecendo, é tanto, se escolhermos não o negar, não inventar desculpas nem justificações. Vendo, simplesmente, sem “mas”, sem “ses”, sem “um dia”, enquanto passam todos os dias.

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