sábado, 6 de agosto de 2022

Hoje dói-me pensar,
dói-me a mão com que escrevo,
dói-me a palavra que ontem disse
e também a que não disse,
dói-me o mundo.

Há dias que são como espaços preparados
para que tudo doa.

Só deus não me dói hoje.
Será porque ele não existe?

Roberto Juarroz

E ele não existir dói-me. Talvez houvesse uma possibilidade de ordem nessa existência. Uma esperança de confiar. Um mal e um bem, um certo e um errado. Uma justiça velada, mas feroz. Uma mão que amparasse, uma voz que indicasse, uma presença que aconchegasse o vazio. Uma ideia que nos inundasse e nos tomasse, varresse todas as dúvidas. Uma razão para a emoção, uma emoção com razão. Uma crença em algo que dá alento, um sentido no abismo do caos, um fabricante de coincidências como migalhas para um destino.  Nós concretos na teia do abstracto. Alguma ordem onde não há nada. E esse nada dói. Esse nada é não saber, não saber quase nada. Todos os quases doem. Quase sempre. O sempre já não me dói. Será porque não existe?

2 comentários:

  1. é que sem isso não há nada para perceber

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    1. Viver não sabendo, sabendo que se sabe sempre quase nada...é uma espécie de aceitação do caos. Talvez não haja, mesmo, nada para perceber :)

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