quinta-feira, 22 de setembro de 2016


... O meu deve estar cravejado de buracos negros, só pode...
Nos últimos anos tem sido um atrás do outro, onde tudo parece desaparecer, ir pelo ralo, sem apelo nem agravo. Sem eu conseguir evitar. Às vezes leio coisas antigas e pergunto-me como tinha sempre coisas para escrever, para dizer, para tentar explicar. O amor apaixonado é uma fonte inesgotável de coisas boas, de poesia por dentro do olhar que se deita sobre o mundo. Tinha sempre vontade de encontrar coisas giras ou que dissessem o que eu sentia, poemas que diziam quase o que eu queria dizer e eu tentava dizer o resto do meu sentir, ou que lendo me despertassem sentires que eu reconhecia. E as brincadeiras, o sentido de humor, a ironia o meu característico sarcasmo... Às vezes pergunto-me para onde foi tudo isso... E parece que descubro mais um buraco negro que engoliu tudo. Isso tudo e a vontade disso tudo. Ainda que eu ache que ainda está tudo cá dentro só que adormeceu. Será que se dormir tempo demais desaparece? Eu gostava tanto dessas coisas, das brincadeiras, dos sentimentos doces, do sentir enorme, da intensidade que pesava mais que tudo fazendo-me ao mesmo tempo sentir a leveza de só ser, só sentir. Ter momentos de quase flutuar. Não quero ficar amarga, sempre o disse, não quero deixar que os últimos largos anos da minha vida me tirem o que gostei de sentir em mim. Mas a verdade é que estou céptica, não acredito nas pessoas e ainda menos em mim, enganei-me demais acreditando nas sensações que tinha, no que sentia sentirem. Já nem acredito que haja a sorte de certas coisas serem recíprocas, de haver dois gostares parecidos que se encontrem, se tropecem na vida, se vejam e não mais se larguem. Acho que isso é coisa que só se sente de um lado, e se tivermos a sorte de o poder sentir e viver. O resto é coisa de filmes e livros escritos por gente que o sentiu e passou para o papel uma realidade a dois, o sonho,  que na vida real foi de um só. 
Leio coisas minhas antigas e surpreendo-me com o que escrevia, de como as coisas me saíam, de como ainda sei exactamente o que é aquele sentir, mas agora subtraído do acreditar, ou da esperança de poder ser vivido, seja com quem for. Também leio coisas de há um ano, ou dois, e percebo que estou diferente, já não luto comigo e com tantos dos meus porquês, falo do passado como passado, como realidade acabada, como aceitação talvez. Ter aceite e aceitar não entender. Li algures uma coisa sobre a sabedoria e fiquei a pensar naquilo, dizia qualquer coisa como a sabedoria era não querer saber o que não se podia saber, eu andei a pensar naquilo e acho que sim, a verdadeira sabedoria é saber distinguir entre o que é possível saber e entender e o que é apenas perda de tempo e murros em pontas de faca. 
Acho que já não consigo ver as coisas como via, e tantas perguntas que eu tinha, tanta coisa que queria perceber, são todas em última análise, e de alguma forma, respondidas agora pela mesma resposta, como uma chave mestra que fecha todas essas portas a respostas abertas, a respostas por explicar: eu não era amada. Isso no fundo dispensa quaisquer outras explicações. Explica tudo. Eu não era amada e ponto final. Já alguém dizia alguma coisa deste género, que também acabava assim - "ou é amor ou não é, e ponto final" -, e eu já não me lembrar exactamente da frase, mas que sei que não era esta, prova que realmente algo em mim está diferente.  Resta saber o que mais se perdeu em mim de mim. Que parte esta história toda me arrancou que eu não consiga recuperar. E se essa não era a minha melhor parte - o melhor de mim, o melhor que eu podia ser, e o que afinal era mais eu. E desapareceu da face da vida. E se desapareceu fico-me a perguntar se essa parte era realmente minha, ou só emprestada.

7 comentários:

  1. Olá querida Vi!
    A melhor parte de nós revela-se quando nos "acendemos"nos outros. Com amor, paixão,entusiasmo, cumplicidade, carinho, miminho muito miminho :))
    No cap.21 do livro Um rio chamado tempo uma casa chamada terra do Mia Couto,encontrei algo que é talvez a resposta às questões levantadas no teu texto. "A chave da chuva- Eis o que eu aprendi nesses vales onde se afundam os poentes: afinal tudo são luzes e a gente se acende é nos outros". Tão verdade e tão bonito.
    Acende-te de novo!
    Abraço
    Nanda

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  2. :D
    Miúda, já me passate na leitura!! ehehhe isso é que é!!
    Ainda não cheguei a essa parte, mas o meu grande problema, acho eu, é que eu sou assim eu acendo-me nos outros e isso faz-me depender de outros para ter luz... não é bom, pode ser bonito, mas não é bom Nanda. Temos de saber acender-nos pelo amor a nós, à vida, e também aos outros, mas este "também" é fundamental. Acho que é isso que ando a aprender, ou tentar, ter amor a mim, viver por mim, mas ainda não acho que seja razão ou fundamento de existir. Não me faz brilhar, não me faz viver com luz por dentro. Ainda preciso dos outros, como preciso dos teus comentários e de saber que chego a alguém às vezes até para fazer uma coisa de que preciso e gosto:escrever.
    Um grande beijinho
    Vi
    (PS- se me tivesses de dar um nome que não Olvido ou outro que já me conheceste que nome me darias tu?... ando cá com umas ideias de mudar de nome )

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  3. E a mim faz falta o que escreves! :) Super coincidência conhecer te pela Net! "Acontecências" (acontecer coincidências?!). Gostei desta palavra do Mia( cap.20)assim como gostei de "tudo são coincidências, meu caro. E todos sabemos que coincidência é coisa que nunca existe"(cap.17)
    Dar te um nome? ... Luar de Janeiro (não tem parceiro, no sentido de incomparável, único).Fada Rinha (fã da ronha/rinha):))) Leonor (Leonor vai para a fonte, vai formosa e não segura)...
    ???
    E porque não o teu, o verdadeiro?
    Beijinhos

    Nanda

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  4. :)
    Os neologismos do Mia são deliciosos, sim... nunca tinhas lido nada dele?
    Luar é um nome de que gosto sim, vou pensar nisso... acho que tenho de mudar de nome para poder tornar este blog mais "público", para não o associarem a nada... e o meu nome verdadeiro, é um todo que estes blogs não abarcam, aqui ficam só partes de mim, curiosamente aquelas que quem conhece o todo não chega a ver - talvez afinal não seja o todo ;)
    E sim, foi um bom tropeço, tu no meu blog eu nos teus comentários ;))
    ...há tropeços dos bons, só não sei o que viste - ou leste - que nos faça ainda estar aqui a conversar até hoje...
    beijo
    Vi

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  5. Nada. Nunca tinha lido nada dele. E agradeço-te por mo teres apresentado:)
    Talvez tenha de mudar o meu nome também. Que nome me queres dar?Acerca de ti, gosto da tua escrita inteligente,perfeccionista, criativa, doce. Porque tu és capaz ser realista e partir pedra e no entanto és capaz de uma doçura imensa. Frequentemente dou por mim a reflectir sobre algo teu que acabei de ler.Muito obrigada querida Vi
    Abraço (o todo de ti)
    Nanda

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  6. Olha que bom!!!... que boa noticia me deste, deixa-me muito contente ter-te dado a conhecer um autor que estás a gostar de ler :)))) já fiz alguma coisa de verdadeiramente útil nos últimos tempos ;).
    Quanto à minha escrita, sinto-a fugir-me, se alguma vez soube escrever já não sei. Na verdade eu sempre disse que só sabia sentir, e só sabia escrever sobre esse sentir que extravasava pelas palavras. Não sei escrever sobre outras coisas que não sejam coisas que sinto e reflexões sobre a estupidez de tantos sentires que me assolam...
    Quanto ao teu nome, não sei, sei que te vejo como uma pessoa doce e sonhadora, uma menina que não se deixou amargar pela vida, talvez o teu nome seja esse eterna menina :) É essa a ideia que tenho de ti, o tempo e a vida não te corroeu. E isso é muito bom, sabes? Tenho uma grande grande amiga que é como tu, e uma das razões porque a admiro é por isso, tem uma doçura incorruptível (outro nome bom para ti)
    (isto de se conversar em comentários de blog tem piada... ehehhe)
    Beijo,
    Vi

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