domingo, 14 de novembro de 2021

[foto @jordanioo]
(o baloiço o ultimo reduto de toda a meninice... que eu ainda adoro, mas tantas vezes vazio demais)
 

Ontem acordei para uma nova realidade com o choro do minha filha no quarto, do outro lado do corredor. Levantei-me e fui ter com ela: o primeiro desgosto de amor, ou qualquer coisa que lhe cheira a isso mas lhe sabe mal, pelo menos na manhã de ontem. Muitas mais virão, a história é sempre assim. Como virão outras tantas de coração a transbordar e o brilho dos olhos a ofuscar o sol mais límpido. É assim, resta perceber que é, e tentar equilíbrios, gerir desgostos, prolongar os sorrisos. Um choro pegado, contínuo, uma dor que rasga por dentro, a mágoa do engano, o punhal de mentiras frescas. Não importa a idade, é tudo o mesmo, só que quando desfloram essa ignorância, essa primeira vez dói mais. A alma ainda estava intacta nessas dores. As primeiras feridas, como o primeiro amor, marcam mais, sentem-se mais, até demais. Dei-lhe o mimo que sei que não cura, como sei que nada cura estas dores nestes momentos, mas dei-lhe amparo em abraços, e aconchego como colo. Dei-lhe o que gostaria tantas vezes de ter tido, quando as manhãs me acordavam assim, ou parecido. Não importa a idade, é tudo o mesmo, só varia o numero de cicatrizes que cada um conta, e o que isso altera na alma, que é pouco, ou devia ser. Arranjei-lhe programa com as amigas à tarde para sair de casa e tentar distrai-se e poder dizer tudo o que a mim não sentia poder dizer. No fim do dia vieram para cá, fiz o jantar para todas e ela voltava a rir-se e eu a saber quanto duram esses risos e o que às vezes custam. Foi dormir, eu bebi uns copos de vinho no sofá, vi uns episódios duma vida que me arranca da minha e que procuro cada vez mais, adormeci, acordei, fui para a cama às cinco da matina. De manhã acordo antes dela, sei (desconfio) que vai acordar na mesma, ou parecido, espero pelo sinal. Não tarda. Entra-me no quarto a chorar,  com o telemóvel na mão: Olha mãe, olha isto...  Não importa a idade, é tudo o mesmo, e talvez seja bom sinal (será mesmo?) quando é assim, enquanto puderes manter os sentimentos e as emoções sem idade talvez a alma tenha menos rugas, mesmo que riscada de cicatrizes. É um equilíbrio difícil, talvez seja preciso que a alma seja grande(ou que não tenha tamanho, talvez), seja forte, resistente à dor e muito teimosa de sonhos... serão todas o mesmo? Acho que não. Oiço a minha filha, aninhada nos meus braços, entre soluços destroçados e risos roubados, e rezo para que a alma dela não seja como a minha. Não estarei para sempre do outro lado do corredor, e custa tanto quando não está ninguém. Tanto. A minha filha ainda não sabe. Não importa a idade, é tudo o mesmo. 

8 comentários:

  1. Pois é Vi, desgostos de amor...acho que todos passamos por isso, quando somos mais novos são "situações" diferentes do que em adulto...
    Bom domingo:)

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    1. Serão mesmo? Ou só expectativas são diferentes, e estamos já mais calejados, mais duros, mais descrentes? Sentiremos de forma tão diferente assim?OU só aprendemos a relativizar tudo na vida, até o que não devíamos?
      Bom domingo, Legionario :)

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    2. Dói sempre, seja qual for a idade. A diferença está na inocência do primeiro amor e na dor do primeiro desgosto. Com os anos o coração fica mais frio e tudo é mais difícil. Deixamos de acreditar (falo por mim)
      Um beijo grande para ela e outro para ti❤️

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    3. O coração fica mais frio, ou aprende a defender-se porque não se tornou mais frio? E nós aprendemos a disfarçar, a não chorar, a não pedir colo, mas hoje vi sem filtros tanta coisa que senti há não tanto tempo assim, mas que aprendemos a não mostrar, a querer relativizar, minimizar... mas a mágoa? não achei que fosse diferente, talvez apenas se limem as arestas mais cortantes porque as expectativas estão mais rombas...
      Não quero deixar de acreditar, mesmo que, às vezes, seja a única coisa que quero. :)
      Beijo também para ti, JI :)

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  2. Trabalho com adolescentes, os sentimentos : das duas uma: ou eu não cresci, ou eles crescem logo! Mas não, há dor, há receio, há muito amor e carinho com o acréscimo das descobertas. Personalidade a formar-se, lamento que sofra, afinal quando gostamos, só aquela pessoa parece ser a melhor para nós. Um beijo na mãe e filha

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    1. Estou na mesma, se calhar eu não cresci... ou ela cresceu demais em pouco tempo. Não sei. :)
      Quando gostamos, se realmente gostarmos, só aquela pessoa nos interessa - foi o que ela hoje me repetiu entre soluços, mágoas e incredulidades :) e eu não sei contradizê-la nisto, nem valerá a pena dizer que gostará de outras pessoas ainda, como sei que acontecerá. Não acreditaria, porque acredita no que diz, e eu percebo-a.

      Beijo :)

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    2. Também percebo, não adianta ela vai sarar a ferida. .)

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